sábado, 15 de dezembro de 2012

Curso elementar de catalão

Uma exposição no jardim do Palau Robert

«Vi: Beguda alcohòlica obtinguda per fermentació del suc del raïm. Segons les varietats utilitzades i el mètode d'elaboració, es poden obtenir diversos tipus de vi: blanc, rosat, negre, cava, dolç, ranci etc.»

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Bonifácio Alicante Bouschet 2009

António Francisco Bonifácio & Filhos (Carvoeira, Torres Vedras). Regional Lisboa. 13% Vol. Cerca de 4 € (Jumbo).
Cor intensa. Aroma de fruta bem madura e café. Muito saboroso, com leve e agradável travo.

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Posologia

Cá estão as contas que eu faço.

«Tenho gozado de excelente saúde numa idade avançada porque todos os dias, desde que me lembro, tenho consumido uma garrafa de vinho, excepto quando não me sinto bem. Aí consumo duas garrafas.»

Um bispo de Sevilha

(Leitor: como seu compatrício, aconselho-o a correr ao Aldi e ver se apanha o Señorio de Gayan Gran Reserva 2007, que puseram ontem à venda, a 2,69 €. Muita bom.)

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

sábado, 17 de novembro de 2012

Erva Pata 2007

Casa Agrícola Ribeiro Corrêa. DOC Arruda. Touriga Nacional, Tinta Roriz, Tinta Miúda, Cabernet Sauvignon. 13,5% Vol. 8,69 € (Intermarché).
Lembra azeitona e fruta e plantas perfumosas. Muito fino, com certa tipicidade.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Serviços mínimos

«A mágoa pode ser aliviada com bom sono, um banho e um copo de vinho.»

Atribuído a São Tomás de Aquino

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Alegria

«A melhor forma de combater os fascistas religiosos, sejam eles evangélicos, como nos Estados Unidos e no Brasil, judeus, muçulmanos ou hindus, é através da alegria ― do sexo, da música, do vinho e dos rojões.»

José Eduardo Agualusa, na revista LER de Novembro (n.º 118)

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Bétula 2011

Catarina Montenegro C. M. Santos. Regional Duriense. Viognier, Sauvignon Blanc. 13% Vol. Oferta do produtor (? €).
Cheirando-o, lembra-me a casca do ananás, pelo tropical e o verde. Também lhe acho sinais de toranja e de bolacha. Está citrino e bem agradável de beber.

quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Classicismo

Eu também sou muito cioso das minhas garrafas.

«Sua mãe não bebia vinho, quando muito um cálice pequeno de licor ou de Porto, ou então uma taça de champanhe. Não era da boa tradição as mulheres tomarem vinho, ainda mais da maneira copiosa dos homens. (Jean-François Revel conta que na Antiguidade beber vinho era proibido às mulheres e que há relatos históricos de maridos que mataram as esposas por terem ido beber vinho às escondidas na adega.)»

Rubem Fonseca, em «José», pp. 11-12 (Sextante, 2012)

sábado, 27 de outubro de 2012

Lavradores de Feitoria 2009 (Tinto)

DOC Douro. Touriga Nacional, Touriga Franca, Tinta Roriz, Tinta Barroca. 13% Vol. 3,98 € (Intermarché).
Bom aroma de fruta, coberto de notas vegetais secas, com sinais de cacau. Ligeiramente amargo.

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Continuamos a apresentar

Entretanto, ainda tive a alminha de beber e calar o Vinha Grande 2008, tinto.

Também, se é para dizer que o vinho cheira e sabe a Sugus, e que por isso é sugulento, e que é bom comò caramelo, como me ocorreu quando há dias nos deliciávamos com o Crasto Superior 2010, talvez seja melhor estar calado.

sábado, 20 de outubro de 2012

Peludo e rabudo

Primeiras linhas de um artigo oportuno:
«Byron falou de “clarete leve e Madeira forte”, mas será o vinho “poesia engarrafada”, como Robert Louis Stevenson o descreveu? Não, talvez, se percorrer a imortal prosa da típica nota de prova de vinho (as minhas incluídas). Auberon Waugh foi idiossincrático, descrevendo uma vez um tinto de Languedoc como “peludo e rabudo”; Kingsley Amis, mal-humorado: “Quando oiço alguém falar de um vinho austero e impiedoso, torno-me um pouco austero e impiedoso eu próprio.”»

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Voltamos a apresentar

Nas últimas semanas, para além de não publicar aqui texto algum, não tomei uma só nota de prova. Mas bebi com a devida religião óptimos vinhos, como o Casa Cadaval Trincadeira Vinhas Velhas 2007 ou o Sidónio de Sousa Reserva 2005.

Sem os farejar, sem esquadrinhar, bebi-os. Não escrevi sobre eles uma palavra, fosse compreensível ou delírio. Portanto, bebi-os e, de certa forma, perdi-os.

Vinus fugit.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Nícias e Demóstenes

Um diálogo entre Nícias e Demóstenes, convencidos de não se poderem livrar de certo escravo da Paflagónia.

«NÍCIAS
É melhor então morrer; mas procuremos a morte mais heróica.

DEMÓSTENES
Deixa-me pensar, qual é a mais heróica?

NÍCIAS
Bebamos o sangue de um touro; foi essa morte que Temístocles escolheu.

DEMÓSTENES
Não, isso não, antes um copo cheio de bom vinho puro em honra do Bom Génio; porventura, podemos topar com uma ideia feliz.

NÍCIAS
Olha-me este! «Vinho puro»! A tua cabeça está em querer beber? Será que um homem pode lançar uma ideia brilhante em estando bêbado?

DEMÓSTENES
Sem dúvida. Vai, parvo, rebenta-te com água; atreves-te a acusar o vinho de toldar a razão? Dá-me exemplos de efeitos mais maravilhosos que os do vinho. Ouve! Quando um homem bebe, é rico, tudo o que toca é bem sucedido, ganha processos legais, é feliz e ajuda os amigos. Anda lá, traz cá depressa um jarro de vinho, para eu poder embeber o meu cérebro e ter uma ideia engenhosa.

NÍCIAS
Meu Deus! O que pode fazer por nós tu pores-te a beber?

DEMÓSTENES
Muito. Mas traz-mo, enquanto eu tomo o meu lugar. Uma vez bebido, espalharei pequeninas ideias, pequeninas frases, pequeninos raciocínios por toda a parte.»

Aristófanes, em «Os Cavaleiros»

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Casal da Coelheira Reserva 2010

Centro Agrícola de Tramagal. Regional Tejo. Touriga Nacional, Cabernet Sauvignon, Touriga Franca. 13% Vol. 4,98 € (Pingo Doce).
Cor escura. Intenso aroma frutado, com um perfume silvestre e floral. Muito agradável e persistente.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Eis o diabo

Por estes dias, «emigrar» é o verbo. Em Portugal, nós conjugamo-lo como ninguém. Temos séculos de prática. Está-nos na massa do sangue. Quando não nos achamos em apuros financeiros, é o país que é estreito, e triste, e uma choldra ignóbil — enquanto o Mundo pula e avança, e, mesmo que tenha defeitos, ao menos não são os de Portugal, sem dúvida os mais execráveis do mundo.

Hoje, todavia, quem considere a possibilidade de partir deve ter em conta este revés fatal: é que deixará de poder ir ao Lidl comprar, por um ou dois euros e tal, no máximo, o seu Azinhaga de Ouro Reserva, da Castelinho, os seus Torre de Ferro, de Cabriz*, o seu branquinho Uvas Douradas, da Cooperativa de Cantanhede; e os rapazes, apetecendo um vinho capaz mas conforme às magras posses, em não havendo onde pilhar o seu Festa Rija, da Alorna, ver-se-ão forçados a embeber as detestáveis misturas de vinhos da União Europeia.

Portanto, se, por um lado, ansiamos por mandar Portugal às malvas, por outro, não queremos misturas. Donde, compatriotas: — Emigrar ou não emigrar? Eis o diabo.

* Aliás, da Dão Sul. Não é certo que seja de Cabriz, porque, para além desta, a empresa tem mais três quintas no Dão.

sábado, 8 de setembro de 2012

Chão Rijo 2009 (Tinto)

Adega Regional de Colares. Regional Lisboa. Castelão. 13% Vol. 3,45 €.
Muito agradável aroma frutado, também achocolatado e resinoso. Bem fresco e saboroso. Acompanhou optimamente um caril algo picante.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

É fruta ou carvalho

Viva, leitor! Estimo que se encontre bem-humorado e de saúde, e que possamos beber um copo um dia destes.

Entretanto, para o compensar da irregularidade estival, o «Amável Vinho» publica hoje um vídeo que, em cerca de quarenta e cinco segundos, ensina a provar e qualificar com o desembaraço dos profissionais. Larry David mostra-lhe como não tem nada que saber.


quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Como morrer novo

«Consumir vinho com moderação diariamente ajudará as pessoas a morrer novas o mais tarde possível

Dr. Philip Norrie

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Serra Mãe Reserva 2005

SIVIPA. DOC Palmela. Castelão. 13,5% Vol. ? €.
Cor intensa. Aroma fino de fruta vermelha madura, um sinal vegetal, outro de anis. Aveludado, com boa acidez.

sábado, 11 de agosto de 2012

Não sou um cacho

«Na verdade, senhora — respondeu Sancho —, nunca na minha vida bebi por vício; com sede bem poderia ser, porque não tenho nada de hipócrita; bebo quando tenho vontade, e quando não a tenho, e quando mo dão, para não parecer demasiado cerimonioso ou malcriado; que a um brinde de um amigo, — que coração haverá tão de mármore que não erga o seu copo? Mas embora beba não sou um cacho, tanto mais que os escudeiros dos cavaleiros andantes quase sempre bebem água, porque andam sempre por florestas, bosques e prados, montanhas e rochedos, sem achar uma pinguinha de vinho, embora por ela dêem os olhos da cara.»

Miguel de Cervantes, em «D. Quixote de la Mancha II», p. 809 (Biblioteca Editores Independentes, 2007)

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Ribeiro Corrêa Chardonnay 2009

Casa Agrícola Ribeiro Corrêa. Regional Lisboa. 13% Vol. 6,49 € (Intermarché, Arruda dos Vinhos).
Perfumado e fresco. Pêssego, coalhada de limão. Sabor amanteigado.

sábado, 4 de agosto de 2012

Juntar vinho

«Quando uma receita diz “juntar vinho”, nunca perguntar “a quê?”.»

Anónimo

terça-feira, 31 de julho de 2012

Pegos Claros 2005

Companhia das Quintas. DOC Palmela. Castelão. 14% Vol. Cerca de 4 € (Ecomarché, Merceana).
Às primeiras, carnudo e achocolatado. Dias depois, o típico bálsamo de fruta, compota, sinais de baunilha. Gostava-o menos alcoólico.

sexta-feira, 27 de julho de 2012

Não aldrabarás com floreados

«A mais nobre tradição dos Nicolau de Almeida era a prova de vinhos. Todos sabem de cor os seus mandamentos. “O que não cheira bem, não se mete à boca”, reza a primeira lição. A apreciação deve ser curta e clara, floreados escondem pouco saber e muita vaidade, ordena a segunda.»

Ana Sofia Fonseca, em «Barca Velha: Histórias de Um Vinho», p. 48 (Oficina do Livro, 2012)

terça-feira, 24 de julho de 2012

Entrevista com António Barreto

Que diz sobre os portugueses o vinho que se produz em Portugal?
Diz que o melhor vinho de Portugal e um dos melhores vinhos do mundo, o vinho do Porto, foi feito há muito, resultou da colaboração entre Portugueses e estrangeiros e era muito pouco apreciado e bebido em Portugal.
Diz também que os Portugueses mudaram muito nestes trinta ou quarenta anos. Nos anos setenta, era reduzidíssimo o número de boas garrafas de vinho tinto que se podia comprar e beber em Portugal. E ainda menor o de vinhos brancos. Hoje, há excelentes vinhos de excepcional qualidade, comparáveis com o que de melhor se faz.

Disse em outra entrevista: — «Gosto muito de vinho para beber, para estudar, como arte.» Uma garrafa de vinho pode ser tão bela como o binómio de Newton e a Vénus de Milo?
Dizem os puritanos e os abstémios que, quando se fala de vinho, há sempre a tendência para exagerar. É capaz de ser verdade. Mas há motivos para isso. O que um bom vinho significa, de tradição, de técnica, de cuidado, de ciência, de saber acumulado e de emoção é quase inacreditável! Quem não percebe isso, percebe pouco da vida.

Num discurso, citou o Barão de Forrester: — «Em casa de um gentleman português, é tão raro encontrar um livro como uma garrafa de vinho!» Em sua casa, há tantas garrafas como livros? De umas e outros, mais clássicos ou modernos?
Muitos livros e muitas garrafas. De todas as idades. De todos os volumes. De todas as cores. De todos os espíritos.

sábado, 21 de julho de 2012

Permanência e lealdade

O sociólogo António Barreto é sobejamente conhecido e reconhecido pelo valor da sua actividade e do seu pensamento. Presidente do Conselho de Administração da Fundação Francisco Manuel dos Santos, dedicada ao estudo da sociedade portuguesa, colunista no «Público», muitas vezes chamado a comentar nas televisões actualidade e política — mas também presidente da Assembleia Geral da Lavradores de Feitoria, autor da monografia «Douro» e, com a cineasta Joana Pontes, do documentário «As Horas do Douro» (a mesma dupla havia anteriormente realizado a série televisiva «Portugal, Um Retrato Social»).

É António Barreto o próximo entrevistado no «Amável Vinho». Por antecipação, há que ler uma crónica sua, de 2007, intitulada «São Martinho», e apreciar a colecção das suas fotografias, que vem publicando no blogue «Jacarandá».

António Barreto também é fotógrafo amador

A propósito da floração dos jacarandás de Lisboa, o sociólogo escreveu esta frase oportuna, que deixo aqui afixada, como uma revelação singela e fundamental: — «(…) é bom perceber que há coisas eternas, cuja repetição sazonal nos dá a garantia de que a vida nos oferece permanência e lealdade!»

sexta-feira, 20 de julho de 2012

Um homem muito notável

No dia em que nos despedimos do Professor José Hermano Saraiva — um homem muito notável, como ele dizia de muitos homens e muitas obras —, copos ao alto em honra da sua vida; pela paz da sua alma.

Ficam os seus livros, os seus programas, o seu exemplo de dedicação à cultura portuguesa, de estudo, de entusiasmo, de trabalho, de transmissão do saber. E esta reflexão sua, recolhida num «A Alma e a Gente», para guardar:
«Nós somos aquilo em que acreditamos, e, se não acreditarmos em nada, não somos coisa nenhuma.»

terça-feira, 17 de julho de 2012

Adega Coop. de Borba Reserva 1978

Sabendo da minha religião pelo vinho, uma alma magnânima doou-me uma garrafa de 1978. 34 anos, um tinto de Borba. Quantos dariam alguma coisa por ele? Eu mesmo, apesar do bom estado da cápsula e do satisfatório nível de vinho na garrafa, talvez só o comprasse muito barato.

Em todo o caso, abri com fé e o devido cuidado a atenciosa dádiva. Mal retirei o topo da cápsula, começou a cheirar bem. A rolha quebrou-se no gargalo, mas saiu em metades inteiras. Para não o deitar a perder, não decantei o vinho.

Ah, leitor. Ele não só estava bebível, como estava vivo e bom. Bem entendido, não era nenhum alto prodígio. Mas não me enterneceu menos que a visão das muitas andorinhas que veraneiam pelas ruas frescas da Ericeira.

Almas magnânimas, vinho vivaz, as andorinhas. Afinal, podemos ter esperança.

Um copo de esperança

Adega Coop. de Borba Reserva 1978
12,5% Vol. Sem mais indicações.
Rubi alourado. Café, chocolate, couro, uma nota vegetal balsâmica, outra a lembrar espargos. Um côvado de veludo! Persistência notável.

sábado, 14 de julho de 2012

Inóxia carraspana

«Ega deu imediatamente um pulo da cama, e atordoado, esguedelhado, procurava a roupa, com as canelas nuas, tropeçando contra os móveis. Só achou o gibão de Satanás. Chamaram o criado, que trouxe umas calças de Craft. Ega enfiou-as à pressa: e sem se lavar, com a barba por fazer, a gola do paletó erguida, enterrou enfim na cabeça o boné escocês, voltou-se para Carlos, disse com um ar trágico:

— Vamos a isso!

Craft, que se erguera, foi acompanhá-los ao portão, onde esperava o coupé de Carlos. Na alameda de acácias, tão tenebrosa na véspera sob a chuva, cantavam agora os pássaros. A quinta, fresca e lavada, verdejava ao sol. O grande terra-nova do Craft pulava em roda deles.

— Dói-te a cabeça, Ega? — perguntou Craft.

— Não — respondeu o outro, acabando de abotoar o paletó. — Eu ontem não estava bêbado… O que estava era fraco.

Mas, ao entrar para o coupé, fez, com um ar profundo e filosófico, esta reflexão: — O que é a gente beber bons vinhos… Estou como se não fosse nada!»

Eça de Queiroz, em «Os Maias»

terça-feira, 10 de julho de 2012

Um brinde com Solista Touriga Nacional 2009

No dia em que Sokolov, muitas vezes referido como o maior pianista vivo, toca em Sintra, um brinde à sua grande arte!

Solista Touriga Nacional 2009
Adega Mayor. Regional Alentejano. Touriga Nacional. 14% Vol. Oferta do produtor (11,90 €).
Muito perfumoso. Frutado, torradinho, condimentado, com sinais de baunilha e canela. Airoso e sedutor.

Adenda § Não posso brindar a Sokolov e deixar de saudar, com a mesma admiração, a actuação de Artur Pizarro no Palácio de Queluz, anteontem. O leitor sabe como o sublime nos transporta, nos aproxima do Divino. Assim foi Pizarro. Importa reconhecê-lo, seguindo o preceito legado por Rodin: — «A admiração é um vinho generoso para os espíritos nobres.»

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Fazer com termos

Vista de perto

Caramba. Já vai fazer um ano, uma tarde incrível que passei na Quinta dos Termos. Tinha resolvido não escrever sobre ela. Nas semanas precedentes, visitara sucessivamente, com pouco intervalo, a Casa Ermelinda Freitas, a Casa das Gaeiras, a Herdade do Mouchão, a Quinta do Monte d'Oiro. Calhou depois a ida aos Termos, em circunstâncias diferentes, particulares. Para mais, os sucessos dessa tarde foram tão singulares, e inesperados, e pessoais, que achei por bem guardá-los.

No entanto, caí em mim. Não fiz no «Amável Vinho», até à data, uma só referência à Quinta dos Termos. O meu lapso é tão mais deplorável quanto o lugar é inspirador de enlevos, a produção, merecedora de louvores, a gente, credora de boas palavras. Pois urge repará-lo — mesmo porque, não obstante a profusão de prémios recebidos, a Quinta dos Termos ainda parece ser mal conhecida dos consumidores.

Para abreviar, e não ficar agora o leitor sem saber dos tais sucessos, resumirei o essencial. À chegada, participámos na escolha de um lote de tinto para a Noruega. Depois, almoçámos à mesa de João Carvalho, proprietário dos Termos e presidente da CVR da Beira Interior, com a família, o Prof. Virgílio Loureiro e o Prof. Malfeito Ferreira, os técnicos encarregues da enologia. (Na região, os dois académicos colaboram também com a Cooperativa da Covilhã. Por isso até o vinho de mesa lá fabricado mostra ciência…) Para digerir, o anfitrião conduziu-nos num passeio vagaroso através do relevo acidentado da propriedade, a admirar as videiras, os penedos, os carvalhos-cerquinhos, as serras que configuram a Cova da Beira, o vasto horizonte repassado de calor.

Vista do alto

Antes de partirmos, fomos à adega provar das cubas inúmeros vinhos estremes, sempre na companhia animada e sábia do produtor e dos enólogos. Os vinhos, brancos e tintos, são de uma qualidade excelente, deliciosa. Um melhor que o outro, e são muitos. Sobretudo, estão aptos a enfrentar a prova do tempo, graças a uma rica acidez natural, esmerada pela ciência e pela sensibilidade gastronómica dos vinicultores.

O Prof. Virgílio Loureiro costuma gracejar com quem prova o seu vinho, dando à frase certa entoação que pede acordo: — «Não está mal feitinho!…» Pois não está, não, senhor. Está feito com termos!

terça-feira, 3 de julho de 2012

Horta do Bispo 2005

Agora que por fim dei sumiço a uma caixa deste vinho, desconfio estar involuntariamente participando num estudo sociológico, ou de mercado, ou do psiquismo colectivo, cujo método consiste em vender, disfarçado com um rótulo enigmático, um tintão de categoria a um preçozito ridículo, para depois avaliar como reagem os compradores.
Parece que se chama «Horta do Bispo». Os rótulos indicam 2005, Herdade da Sobreira, Estremoz. «Cuidada selecção de uvas das castas Syrah, Trincadeira e Alicante Bouschet», «12 meses em barricas de carvalho francês e americano», «elegante, equilibrado e persistente».
As pesquisas na Internet não deram em nada. A correspondência com a Rota dos Vinhos do Alentejo também não.
Seja como for, quero deixar declarado, só para o caso, que podem sempre contar comigo para estudos desta natureza. Por mor da ciência, tudo.

Consta que é «Horta do Bispo»

Horta do Bispo 2005
Herdade da Sobreira. Regional Alentejano. Syrah, Trincadeira, Alicante Bouschet. 14% Vol. 2,29 € (Jumbo, Almada).
Retinto. Recendente a fruta madura, ameixas, framboesas, plantas silvestres, especiarias. Taninos levemente amargos, para durar.

sexta-feira, 29 de junho de 2012

S. Filipe 2008 (Tinto)

Filipe Jorge Palhoça. Regional Terras do Sado. Castelão. 13,5% Vol. Cerca de 3,50 € (Jumbo, Setúbal).
Rubi. Exemplar de quão bem mescla o Castelão do Poceirão e arredores com a madeira de carvalho. Um bálsamo frutado perfeitamente casado. Macio, fresco, saboroso. Gostei muito.

terça-feira, 26 de junho de 2012

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Portas do Tejo 2011

Trouxe este branco do Pingo Doce do Fórum Sintra. Ainda o não vi em nenhum outro supermercado.
Recentemente, foi galardoado com «Ouro» no III Concurso de Vinhos Engarrafados do Tejo. No Concurso Nacional de Vinhos de 2012, alcançou a «Prata».
De resto, foi o Portas do Tejo branco que, no ano passado, rendeu à Cooperativa de Almeirim um valioso contrato de fornecimento para a Suécia.
Entre nós, dá-se menos de 2 € por uma garrafa. A crise da dívida não é a crise da liquidez. Graças a Deus.

Portas do Tejo 2011
Adega Cooperativa de Almeirim. Regional Tejo. Fernão Pires, Moscatel Graúdo. 12% Vol. 1,79 €.
Amarelo-claro. Lembra banana e manjericão! (Entretanto, também provei a colheita de 2010. Manteiga e maracujá!) É teso. Sabe à Moscatel. Vai passar o Verão cá em casa.

terça-feira, 19 de junho de 2012

Beyra 2011

Beyra – Vinhos de Altitude. DOC Beira Interior. Síria, Fonte Cal. 13% Vol. 3,95 €.
Amarelo-claro. Vivo aroma citrino. Tângera e toranja. Acidez apetitosa. Muito bom.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Versejar

Outra gota respingada do livrinho de citações «Save Water, Drink Wine».

«Vinho é poesia engarrafada.»

terça-feira, 12 de junho de 2012

Rayo 2010

Descobri este tinto no Supercor. O letreiro junto às garrafas informava que «Rayo de Arraiolos» é uma marca exclusiva do El Corte Inglés e que o enólogo é Rui Reguinga.
A julgar pela coincidência de castas, teor alcoólico e demais indicações, o vinho em apreço e o Fonte da Serrana poderão ser o mesmo.

Rayo 2010
Soc. Agr. D. Diniz. Regional Alentejano. Aragonez, Trincadeira, Touriga Nacional. 13,5% Vol. 2,85 €.
Rubi transparente. Bem aromático. Fruta, torrefacção, caramelos de fruta. Bom de beber.

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Bebe vinho e serás salvo

Uma querida amiga trouxe-nos de Birmingham um livrinho catita. Tem por título «Save Water, Drink Wine». Poupe água, beba vinho.
Podemos dizer que se trata de um livro auto-motivacional. Auto-motiva a beber vinho. Portanto, é uma obra de inestimável valor civilizacional e filosófico. Penso que, vertida para o Português, pode ser instrumental para vencermos a crise. Pois verterei nesta página, às pinguinhas, o meu contributo à Pátria!
Vede se a primeira não corrobora inteiramente o que digo. Vem atribuída à sabedoria popular medieval. Da Alemanha.

«Bebe vinho, e dormirás bem. Dorme, e não pecarás. Evita o pecado, e serás salvo. Logo, bebe vinho e serás salvo.»

terça-feira, 5 de junho de 2012

Dias de vinho e bolos

Pedra do Urso e figueirinha

No tempo em que era aluno da Faculdade de Letras, as terças-feiras eram dias especialmente saborosos. Findas as aulas matutinas, percorria, de metro e autocarro, a curta distância entre a Cidade Universitária e a casa dos meus Avós. (Também o meu Avô Zé Reinaldo frequentara a Cidade Universitária. Não perdia uma só ocasião de dizer que tinha andado nas duas Faculdades, Letras e Direito. «Pois andei! Andei a instalar a canalização.»)
Quando chegava, havia o meu Avô de estar, com um garfo determinado, a recalcar pacientemente os bifes no grelhador. «Adeus, rapaz!» É possível que, ao mesmo tempo, ombro a ombro diante do fogão elevado, a minha Avó Natividade ultimasse o apronto dos condutos, simples, infalíveis, apetitosos.
A mesa estaria posta, com os apetrechos necessários, pão, uns pratinhos sob os copos, para não sujar a toalha. Ocupávamos os nossos lugares. Eu sentava-me à direita do meu Avô, defronte à minha Avó e ao louceiro espelhado.
Enquanto a Natividade distribuía arrozes, saladas com coentros, às vezes batatas fritas (que faz salivar mais um comilão de vinte anos do que bifes e batatas fritas?), o Zé Reinaldo abria a garrafa de Pedra do Urso, visivelmente satisfeito, e enchia bem cheios os copos, como era de regra, até ao rebordo. Fechava a garrafa, pousava-a em seu pratinho. Tomava o copo. Devagar, com cuidado, curvando-se um pouco, levava-o aos lábios, que avançava e dispunha como se o fora beijar, e sorvia o primeiro gole regalado do vinho ligeiramente fresco.
«Comprei esta garrafa para a gente beber, hã?» O meu Avô visivelmente satisfeito. «Este vinho é bom.» (Passados tantos anos, fui eu comprar uma garrafa de Pedra do Urso, e depois outras, para sondar o seu mistério. — Oriundo da Cooperativa da Covilhã. Vinho de Mesa. Rufete, Jaen, Trincadeira. 12,5% Vol. Rubi transparente. Frutado, levemente perfumado. Bem composto, do tipo corredio. — Este vinho é bom, e nem só por ser dos favoritos do meu Avô. Como o Porta dos Cavaleiros, de que gosto muito também por me fazer lembrá-lo, as histórias que contava de quando andou por Viseu, na construção do edifício da Segurança Social, o meu telefonema só para lhe dizer — «Estou na Porta dos Cavaleiros!»)
O meu Avô galhofeiro. «Olha que hoje era peixe! A tua Avó é que teve pena de ti…» Também era ela que nunca esquecia os pudins de chocolate, as roscas de manteiga, as bolinhas de maçapão. «Para que vejas a Avó que aqui tens!» E, com os olhos escuros brilhantes, dobrando os dedos grossos e morenos, fazia-lhe no rosto uma carícia.
Contentes e despreocupados o bastante, o meu Avô e eu bebíamos a garrafa de Pedra do Urso que ele comprava para a gente beber. Mesmo que fosse com peixe, decerto aquele vinho não me consolaria menos. Bebíamos com sede cada decilitro. Decilitrávamos o Pedra do Urso. Nem por isso bebíamos muito. Antes dos dietistas, dos higienistas, dos moralistas modernos, um homem que bebesse pouco era que bebia só meia garrafa às refeições. Nós nem esse pouco, mas eu, mal saído da abstinência, não tardava a sentir um formigueiro suavíssimo na planta dos pés. Por fim, não obstante todo o peso de livros, sebentas e bolos, voltava leve para a Faculdade, com boas cores, saciado e feliz.

sexta-feira, 1 de junho de 2012

Angelus Reserva 2000

Decididamente, preciso aqui de um marcador para absurdos.
Este vinho, encontrei-o no Intermarché de Torres Vedras. (Começa a tomar forma um padrão…) Apanhei a última das últimas garrafas.
2,48 €? Mas anda tudo doudo?

Angelus Reserva 2000
Caves Aliança. DOC Bairrada. Baga. 13% Vol. 2,48 €.
Vermelho-escuro. Aroma complexo, maduro, frutado, fumado, balsâmico. Fino, fresco, taninoso e longo. Óptimo.

terça-feira, 29 de maio de 2012

sexta-feira, 25 de maio de 2012

O sangue de Nosso Senhor

«— Então para desgastar, vá mais esse copito do 47, disse o cónego.
Ele mesmo bebeu pausadamente um bom gole, deu um ah de satisfação, e repoltreando-se:
— Boa gota! Assim pode-se viver!
Estava já rubro, e parecia mais obeso, com o seu grosso jaquetão de flanela e o guardanapo atado ao pescoço.
— Boa gota! repetiu, deste não provou hoje você nas galhetas…
— Credo, mano! exclamou D. Josefa com a boca cheia de fios de aletria, muito escandalizada da irreverência.
O cónego encolheu os ombros com desprezo.
— O credo é prà missa! Esta pretensão de se meter sempre em questões que não percebe! Pois fique sabendo que é duma grande importância a questão da qualidade do vinho, na missa. É que é necessário que o vinho seja bom…
— Concorre para a dignidade do santo sacrifício, disse o pároco muito sério, fazendo uma carícia de joelho a Amélia.
— E não é só isso, disse o cónego tomando logo o tom pedagogo. É que o vinho, quando não é bom e tem ingredientes, deixa um depósito nas galhetas; e, se o sacristão não é cuidadoso e não as limpa, as galhetas ganham um cheiro péssimo. E sabe a senhora o que acontece? Acontece que o sacerdote, quando vai a beber o sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, não está prevenido e faz-lhe uma careta. Ora aí tem a senhora!
E deu um forte chupão ao cálix. Mas estava falador nessa noite, e depois de arrotar devagar, interpelou de novo D. Josefa, assombrada de tanta ciência.
— E diga-me lá então a senhora, já que é tão doutora: o vinho, no divino sacrifício, deve ser branco ou tinto?
D. Josefa parecia-lhe que devia ser tinto, para se parecer mais com o sangue de Nosso Senhor.
— Emende a menina, mugiu o cónego de dedo em riste para Amélia.
Ela recusou-se, com um risinho. Como não era sacristão, não sabia…
— Emende o senhor pároco!
Amaro galhofou. Se era erro ser tinto, então devia ser branco…
— E porquê?
Amaro ouvira dizer que era o costume em Roma.
— E porque? continuava o cónego, pedante e roncão.
Não sabia.
— Porque Nosso Senhor Jesus Cristo, quando pela primeira vez consagrou, fê-lo com vinho branco. E a razão é muito simples: é porque na Judeia nesse tempo, como é notório, não se fabricava vinho tinto… Repita-me a senhora a aletria, faça favor.»

Eça de Queiroz, em «O Crime do Padre Amaro»

terça-feira, 22 de maio de 2012

Alento Reserva 2008 (Tinto)

Luís Louro. Regional Alentejano. Aragonez, Alicante Bouschet, Touriga Nacional, Syrah. 14,5% Vol. Oferta do produtor (preço ronda 11 €).
Vermelho bem escuro. Aroma rico, de compotas de fruta vermelha e silvestre, com um frescor como de coentros, que se faz balsâmico. Elegante, saboroso, persistente. Um vinho esmerado.

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Entrevista com Onésimo Teotónio Almeida. Capítulo III: Dois touros.

É possível que o Onésimo não tenha uma anedota ou um episódio em redor do vinho?
Episódios? Com vinho? Bom, já contei alguns. Lembro-me de, quando jovem, me terem oferecido um passeio à ilha do Faial, algo nada fácil para quem vivia em S. Miguel. Ficava longe, no cabo do mundo. Levaram-me à festa de S. João da Caldeira. O Núcleo Cultural da Horta patrocinara um concurso de quadras e insistiu em que eu participasse. Escrevi umas quantas, mas só me recordo de uma a propósito da animação que lá vi, activada a garrafão:
S. João quando novinho
Veio à festa da Caldeira
Nunca tinha visto vinho,
Dançou pela noite inteira.
As outras eram mais ou menos nesse tom. Nada de especial, porém o tema era o ambiente da festa aquecido pelo vinho.
As anedotas são sobretudo de borrachos. Costumo contá-las em série e receio que sejam todas conhecidas. Além de que anedotas de bêbados exigem encenação. Por escrito, não passam bem. As melhores do género que conheço são de irlandeses; ora essas metem inevitavelmente whiskey ou cerveja. Para incluir vinho têm de ser da Europa mediterrânica. Ou atlântica. Por isso aí vai uma das minhas ilhas:
Numa tourada à corda na Terceira um dos arrojados toureiros, que em plena rua se atiram a enfrentar o bravo animal, estava toldado pelo vinho, não conseguindo por isso ser rápido bastante quando o touro investiu contra ele e quase o espatifou. No hospital, a explicar ao médico os ossos partidos, contou então que viu o touro a correr contra ele e quis fugir: Grosso como estava, comecei a ver dois touros. Havia uma árvore ali perto e ia proteger-me por detrás dela mas, como estava a ver tudo a dobrar, também vi duas árvores. Tinha que ser rápido e então tive a pouca sorte de me esconder detrás da árvore falsa…  e apanhei com o touro verdadeiro.
Para terminar, vai uma ocorrida num almoço com um colega professor de Filosofia na Brown, Jim Van Cleve. Perguntei-lhe se ia beber alguma coisa, pois iria pedir o meu indispensável vinho. Escusou-se com o facto de ter de dar uma aula a seguir. Também eu tenho, comentei. Beba um copo, homem! Vai ver que o discurso lhe sai mais suave. O Jim esperou uns momentos antes de reagir: E o raciocínio… mais tosco.

quarta-feira, 16 de maio de 2012

Entrevista com Onésimo Teotónio Almeida. Capítulo II: Não exagerar.

O seu gosto do vinho é mais português ou mais americano? Na LUSAlândia, sê l(USA)landês?
Não sou nacional-vinhista. Por razões pragmáticas, aqui na Nova Inglaterra para consumo caseiro compro sempre vinho português (muito fácil encontrá-lo) e é ele que usamos para ofertas, quando a ocasião surge. Por metade do preço ou ainda menos, adquiro vinho da qualidade de badaladas marcas francesas ou italianas. E faço publicidade do que é nosso.
Nos restaurantes, se há vinho português, encomendo-o pelas mesmas razões. Não havendo, opto por chilenos ou australianos. E, claro, há sempre alguns seguros vinhos californianos. Por sinal, foi na Califórnia, em Napa Valley, que provei os melhores da minha vida. Na adega de Franz Copolla, o realizador de «O Padrinho». Sei que há outras igualmente boas, mesmo em Portugal, porém foi lá que tive acesso a especialidades fora do alcance da minha bolsa, graças a uma bióloga que ali trabalhava, filha de um casal amigo açor-californiano e morador em Napa. Tratamento VIP, toda a tarde fizeram-nos provar vinhos de altíssima qualidade (vi o preço de uma das garrafas: 800 dólares). Mas não foi esse o critério. Néctares de deuses gregos. Além da sensação inigualável ao bebê-los, a total ausência de ressaca, ou sequer ligeira dor de cabeça, na manhã seguinte. Depois de um sono suave com os anjos.
Ah! E noblesse oblige. Acontece de vez em quando ir a casa de emigrantes portugueses que fazem vinho. Há que provar e, por mais carrascão que seja, agradecer aprovativamente. Mas não exagerar porque, se nos descuidamos em simpatia, somos obrigados a levar connosco umas quantas garrafas.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Entrevista com Onésimo Teotónio Almeida. Capítulo I: Um sabor adstringente.

Onésimo é nome de enófilo, dos que sabem as castas e os terroirs?
Não, de modo nenhum. Nem como diletante sequer. Apenas consumidor rasca — que não significa apreciador de carrascão. Aqui em casa o vinho às refeições é obrigatório (fora delas é facultativo). Não cantarolo essa de vinho ser apenas tinto. Com peixe ou marisco e em dia de calor, branco é que é. Mas, em regra, bebo o clássico tinto. Não me dou com o verde, nem com espumantes. Prefiro maduro e seco. Nada de frutados. Aveludados e encorpados sabem-me especialmente. E é isso. Quase esgotei os meus adjectivos e mesmo esses evito usar, sobretudo se o ambiente é pretensioso e os comensais interessados em marcar pontos, algo que se generalizou na última década. Lembro-me de, há um bom par de anos, um recém-encartado (autodidacta) enólogo no papel de anfitrião em jantar oferecido por uma instituição estatal. Presente à mesa estava uma estrangeira lusófona que, por sinal, horas antes me tinha referido o espanto que lhe causavam os conhecimentos vinícolas dos portugueses. Que empregavam termos por ela nunca então ouvidos, como adstringente. Aconselhei-a não se impressionar em demasia porque se tratava apenas de meia-dúzia de qualificativos por todos usados e abusados, qualquer que fosse a marca de vinho servido. Entretanto chegou a garrafa e o senhor armou cena. Cheirou, voltou a cheirar, provou e, com teatral desdém, deu ordem ao empregado para devolvê-la à procedência por aquele vinho não estar em condições. O moço voltou dali a momentos com outra, seguindo-se nova encenação. Depois da repetida aspiração do aroma, o anfitrião provou e declarou peremptório: Este sim! Tem um sabor adstringente. Cruzei olhares com a estrangeira e ela, no seu delicado silêncio, baixou os olhos e sorriu, como a reconhecer ali mesmo a verdade que eu pouco antes lhe confidenciara.
Quanto a cerveja, nada tenho contra. Não implica isso qualquer desprezo por ela. Já tive mesmo momentos na vida em que desejei ardentemente uma bem fresquinha. Todavia a cerveja é, como diz o outro, algo que se aluga. Tão depressa se bebe como… Ah! E também  já passei o tempo das bebidas brancas. Hoje sou fiel ao vinho. Nada de misturas. Nem de abusos, de que nunca gostei. O vinho só entrou no meu quotidiano já aqui nos States, e desde cedo fiz máxima daquela sábia frase de Shakespeare sobre o álcool, no segundo acto da tragédia «Macbeth»: it provokes the desire but it takes away the performance.

sexta-feira, 11 de maio de 2012

Banquete em três capítulos

O entrevistado da próxima semana é Onésimo Teotónio Almeida, académico e autor açoriano, residente nos Estados Unidos da América há décadas.
Outros dados biográficos relevantes, encontra-os o leitor no sítio da Direcção-Geral do Livro e das Bibliotecas e, em inglês, numa página da Universidade Brown, onde Onésimo lecciona.
Se havia de ser frugal, esta entrevista saiu lauta e sustanciosa — boa para nos consolarmos da bruteza do Mundo. Um banquete que, por não sermos, o leitor e eu, nenhuns glutões, será sobriamente servido em três apetitosos capítulos.
Até lá, tomemos como aperiente o seguinte trecho de um outro colóquio com Onésimo:
«Gosto de humor em qualquer situação. É uma óptima ferramenta para sublinhar uma ideia, torna-a mais interessante. Quanto à ironia, é sempre preferível ao sarcasmo, porque pede mais distância. O sarcástico é muito envolvido e emotivo, com fúria e raiva. Como aquele tipo que vai ao parlamento e diz — “Bandido, gatuno, meu cabrão!” Vem o polícia e diz — “O que se passa lá dentro?” “Nada, estão a fazer a chamada dos deputados.”

E a ironia?
É mais como o tipo que vai a uma casa de chá, onde estão senhoras educadas, e pergunta — “Há aqui algum sítio onde se possa mijar?” As senhoras respondem: — “Olhe, o senhor, naquele corredor, vira à direita, na segunda porta está escrito ‘cavalheiros’. Não faça caso, entre.” A ironia não é aquela coisa portuguesa do escárnio e do maldizer.»

terça-feira, 8 de maio de 2012

Prova Régia 2000

«Em 1987 a recém-criada empresa Alcântara Agrícola, SA, ligada ao grupo Tate & Lyle, adquiriu a Quinta da Romeira, com uma área rondando os 130 hectares. Aí procedeu à plantação de 80 ha de vinha, com as castas recomendadas para a região de Bucelas — Arinto (85%), Esgana-Cão (10%) e Rabo-de-Ovelha (5%). Tinha acabado de se iniciar um grande projecto vitivinícola, sob a batuta do conceituado enólogo Nuno Cancela de Abreu, que iria restituir à região e aos vinhos de Bucelas o fulgor dos séculos passados.»
Prova Régia 2000
Soc. Agr. da Quinta da Romeira de Cima. DOC Bucelas. Arinto. 12% Vol. 3,99 €.
Amarelo. Mais próximo a manteiga do que a mel, o aroma conserva algumas notas frutadas, principalmente citrinas. Semelhante na boca, amanteigado e ainda esperto.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Entrevista com Herman José

«Viver sem vinho não presta.» Isto é só cantiga, ou é de levar a sério?
É absolutamente para levar a sério, desde que o vinho tenha qualidade.

O Herman tem um vinho predilecto? Algum que o deixe especialmente bem-humorado?
Eu sei que pode ser um choque, mas o meu vinho favorito vem do Reims, tem gás, gosto dele gelado, brut ou rosé, e chama-se «champagne».

Apelo ao seu apetite de gastrónomo cosmopolita. Que combinação de petisco e vinho seria digna de uma última ceia?
Há uma dupla divinal: uma flûte de Krug Clos du Mesnil, e um folhado de trufa preta com foie gras… Depois pode morrer-se à vontade.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Hero da Machoca Grande Escolha 2001

Hero do Castanheiro. DOC Palmela. Castelão. 14,2% Vol. 3,99 €.
Vermelho-escuro. A princípio, um odor forte e adocicado, que, não sendo desagradável, chega a lembrar algo parecido com estrume… Depois, primorosamente casado com o carvalho, um vivo aroma de fruta vermelha em compota, que, abrindo, se torna mais fresco e mais fino. Vibrante na boca, com muito sabor e cauda longa. Realmente, um belo vinho.

terça-feira, 24 de abril de 2012

Porto, para os acalmar

«O cónego Dias, pousando o talher, ergueu os braços, e com uma solenidade cómica exclamou:
Hereticus est! É herege!
Hereticus est! também eu digo, rosnou o padre Amaro.
Mas a Gertrudes entrava com a larga travessa do arroz-doce.
— Não falemos nessas coisas, não falemos nessas coisas, disse logo prudentemente o abade. Vamos ao arrozinho. Gertrudes, dá cá a garrafinha do Porto!
Natário, debruçado sobre a mesa, ainda arremessava argumentos a Amaro:
— Absolver é exercer a graça. A graça só é atributo de Deus: em nenhum autor encontra que a graça seja transmissível. Logo...
— Ponho duas objecções... gritou Amaro com o dedo em riste, em atitude de polémica.
— Oh, filhos! oh, filhos! acudiu o bom abade aflito. Deixem a sabatina, que até nem lhes sabe o arrozinho!
Serviu o vinho do Porto, para os acalmar, enchendo os copos devagar, com as precauções clássicas:
— Mil oitocentos e quinze! dizia. Disto não se bebe todos os dias.
Para o saborear, depois de o fazer reluzir à luz na transparência dos copos, repoltreavam-se nas velhas cadeiras de couro; começaram as saúdes! A primeira foi ao abade, que murmurava: — Muita honra... muita honra... Tinha os olhos chorosos de satisfação.»

Eça de Queiroz, em «O Crime do Padre Amaro»

quarta-feira, 18 de abril de 2012

As relíquias

Sábado à tarde, neurose ligeira. No entanto, o projecto de fazer arroz-doce.
É senso comum que o arroz-doce reclama um Tawny decente. (Isso, um homem com a telha e Você a fazer piadinhas. «Tawny Carreira»… Francamente.)
Como de ordinário, vamos às compras de vitualhas. Não vejo nem Porto santo, nem Porto alegre. Acode-me à lembrança o supermercado na vila, onde é raro irmos.
Então aí, que foi que eu pilhei? Duas relíquias portuguesas. JP Garrafeira 1989. Menos de 5 €. Prova Régia 2000. Menos de 4.

Portuguese relics with citrus and morning sunshine

Não dei com um Porto seguro. Mas é que já a neurose, deliquescida, me não ralou.
O pequeno, suave milagre.

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Bebamos!

«— Meus senhores, proponho que saudemos o aniversário de Carlos — bradou, em tom de brinde.
— Apoiado — responderam todos, imitando-o.
— Carlos — continuou o primeiro — bebo aos teus vinte anos! Contes pelos trezentos e sessenta e cinco dias, que se vão seguir ao de hoje, as paixões que fizeres nascer; e possas tu…
— Não se admitem longos speeches; olá! Bebamos! — disse uma voz.
— É sempre mais expressivo o gole que entra, do que a frase que sai — acrescentou outra.
— Até porque, devendo sempre dar-se a primazia ao mais sábio, é o vinho que a merece; pois é ele, neste momento, o que mais sabe.
— Ora faze-nos o favor de nos poupar, ao menos agora, à difícil digestão dos teus calembours.
— Então? Bebamos! — insistiu o coro.
E o brinde foi geral.»

Júlio Dinis, em «Uma Família Inglesa»

terça-feira, 10 de abril de 2012

Monte Mayor 2010 (Rosê)

Adega Mayor. Regional Alentejano. Aragonez, Castelão. 13% Vol. Oferta do produtor.
Cor clara, entre vermelho e rosa. Mais expressivo na boca do que no nariz, tem aroma de cássis e sabor de caramelo, framboesa, e caramelo de framboesa. Agradavelmente seco, bem feito, com uma rica acidez.

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Jovem senhora de idade

O Jogo da Bola, como é conhecida a airosa praça central da Ericeira, tem dois renques de plátanos centenários. São dezoito, ao todo. Desde que o Mundo se não acabe entretanto, devemos visitá-los e saudá-los repetidas vezes em 2013. Completarão 110 anos, votados à abnegada função de prover oxigénio à atmosfera, refúgio às aves e sombra aos veraneantes.
Estes plátanos vetustos, comparados com o grandioso espécime do Rossio de Portalegre, não passam de uns rapazes entradotes. Aquela soberba árvore, cuja copa rondará 35 metros de diâmetro, foi plantada em 1838. Camilo não tinha mais que 13 anos, e outros sete andariam antes de nascer o Eça.

O plátano de Portalegre

Posta em sossego a pouca distância, a Tapada do Chaves, embora muito mais jovem, também é senhora de provecta idade.
Placidamente estirada numa encosta da Serra de São Mamede, a contemplar a paisagem bucólica, não pode deixar de notar que, nos anos deste século, os caminhos se afastaram. De raro em raro, lá passa fora um ou outro automóvel transviado.
Se algum entra a propriedade do Frangoneiro, a prestar visita à senhora, ela não se altera nem se espanta. Ao invés, com modos dignos e serenos, chama de volta o enorme cão pachorrento, que sai a ver quem chega. Um belo animal, igualmente entrado na velhice, com um porte de respeito, o olhar doce e melancólico. Obedece de pronto à voz firme e, desinteressado, retorna ao chão e à modorra o corpanzil.

Aspecto da Tapada do Chaves

A senhora, então, fazendo as honras, apresenta os seus domínios. Mostra a vinha mais antiga. Oitenta e tal anos, já não sabe precisar. Na casa onde moraram os Baptista Fino, conta como, em 1998, quatro anos após se ter construído uma linda adega, a família vendeu tudo aquilo ao grupo da Murganheira. Depois passou-se um mau bocado, com o imbróglio em que se achou a Sociedade Lusa de Negócios. Uma macacoa que, por pouco, levava desta pra melhor a senhora.
Agora, convalescida, no seio de um Interior abatido, observa que o fulgor dos tempos áureos pouco alumia o Futuro. Do alto posto da idade, olha-se ao redor com prudente cepticismo.
Mas então. Lá o que se há-de fazer é persistir em fabricar o bom vinho do Alto Alentejo. Ora coma você este queijo, esse enchido, uma côdea de pão, e prove cá o branco novo e os tintos «Reserva». Quanto ao mais, cavalheiro, é vento que passa sobre os plátanos.

(A propósito da Tapada do Chaves, deve ler-se um texto de Pedro Garcias, publicado há tempo no «Fugas». Aliás, este redactor lê-se sempre com proveito. Escreve sobre o vinho como poucos, num estilo desenvolto, elegante e sensato. Confira.)

terça-feira, 3 de abril de 2012

Sobre o Arinto derramado

Como sucede com livros e filmes, faço por não repetir vinhos. Se almejo a conhecer deles o maior número possível, e tão bons e variegados quanto os haja, é meu dever e meu escrúpulo só deitar mão às garrafas nunca dantes esvaziadas. Não terei tempo de provar muitas centenas de vinhos canónicos, os de antanho como os vindouros. Eis justamente porque é mister empregar cada moeda do erário vínico nesses que não bebi, e dar corpo ao meu próprio cânone.
Oh, mas as Circes e as sereias que a cada passo se insinuam! Sibilino apelo sussurrante de certas vasilhas d’Alsácia! Sabe Deus quantas verti daquele glorioso Bucellas 2005, ao cabo de apurado quatro anos…
O caso é que o meu enlevo hoje, embora outro, escorre de outra alsaciana, e tem outros quatro anos de apurado. Daqui a poucas garrafas, míseras 18, hei-de chorar um rio sobre o Arinto derramado. É o tal da Quinta de Chocapalha, que não verga o formoso nervo nem diante um risoto de grelos com Roquefort. Com Roquefort, senhores!

Arinto com taça de grelos, livros e lunetas

A cada novo copo deste branco, e vão dúzias, sinto-me um Jacinto a descobrir a fava autêntica.
«(…) Que desconsolo! Jacinto, em Paris, sempre abominara favas!… Tentou todavia uma garfada tímida — e de novo aqueles seus olhos, que o pessimismo enevoara, luziram, procurando os meus. Outra larga garfada, concentrada, com uma lentidão de frade que se regala. Depois um brado:
— Óptimo!… Ah, destas favas, sim! Oh que fava! Que delícia!
E por esta santa gula louvava a serra, a arte perfeita das mulheres palreiras que em baixo remexiam as panelas, o Melchior que presidia ao bródio…
— Deste arroz com fava nem em Paris, Melchior amigo!»
Nunca por nunca abominei o Arinto. Que disparate. Mas quando embebo o Chocapalha, dou em bradar (entre mim) como o Príncipe de Tormes: — Óptimo!… Ah, deste Arinto, sim! Oh, que Arinto! Que delícia!
Deste, nem em Bucelas, leitor amigo!

sexta-feira, 30 de março de 2012

Um brinde a Vincent

À memória de Vincent van Gogh, nascido neste dia, em 1853.
É uma boa ocasião para (re)vermos o encantador «Lust for Life», de V. Minelli, ou para nos voltarmos a deixar comover com «Vincent», de Don McLean.
Este quadro, datado de 1888, consta que foi o único que compraram a Van Gogh. No ano da sua morte.

«Vinha Vermelha em Arles»

«Mas domingo, se tu tivesses estado connosco! — vimos uma vinha vermelha, toda vermelha como vinho tinto. Na lonjura tornava-se amarela, e depois um céu verde com um sol, terrenos violeta após a chuva e cintilando amarelo aqui e além, onde se reflectia o sol poente.»
(Carta de Vincent para o irmão Theo van Gogh)

segunda-feira, 26 de março de 2012

Alento Reserva 2010

Luís Louro. Regional Alentejano. Arinto, Antão Vaz. 13% Vol. Oferta do produtor.
Amarelo-claro. Notas aromáticas tostadas, de baunilha, sobre citrinos e marmelo. Bem proporcionado na boca, saboroso, com acidez e persistência apreciáveis.

quinta-feira, 15 de março de 2012

Entrevista com José Bento dos Santos

O que é, de concreto, que distingue um vinho bom de um outro sublime? O que é a quinta-essência do vinho?
Tal como em quase tudo na vida, o sublime é o que nos emociona. Num vinho, tal como na arte, o factor complexidade é determinante. Pode ser um clássico, que nos toca essencialmente pela sua consistência ao longo da história, pode ser um moderno, que nos impressiona pela criatividade, pela diferença ou pela surpresa. Mas o sublime tem sempre que nos provocar uma sentida emoção.

Algum vinho em particular lhe merece o mesmo apreço que tem por pão com manteiga?
O pão com manteiga não é, nunca é, simplesmente «pão» com «manteiga». É pão sublime, de formato natural, ácido, fresco, com odor e gosto profundo, e a manteiga, de grande qualidade, de leite inteiro, recolhido na hora adequada, batida à mão. A simplicidade aparente do enunciado «pão com manteiga» torna-se na complexidade extrema do gosto sublime. Tal como no vinho, um grande borgonha, produzido num terroir único, por um produtor de referência e num ano excepcional, pode ser mais que o sublime, o êxtase. E até vai bem com o pão com manteiga referido…

Desculpe o prosaísmo, mas não se pode ir ao mestre e não pedir ensinamento. Afinal, que vinho acompanha na perfeição os nossos pratos de bacalhau mais tradicionais?
Quando dizemos que temos 1000 maneiras de confeccionar bacalhau, com elementos de cozedura distintos, com diferentes acompanhamentos para cada caso, os vinhos mais adequados podem (devem) ser diferentes. Se, no bacalhau cozido com todos, um tinto jovem e vivo parece indicado (dos meus, sugeriria o Lybra tinto), já um bacalhau assado ou no forno pode configurar um tinto um pouco mais elaborado (tenho tido óptimas experiências com o meu Têmpera). Se for um bacalhau com natas, um bacalhau espiritual, ou mesmo um bacalhau à Braz (com a presença dos ovos), não hesitava num vinho branco com algum estágio, que lhe conferisse peso e complexidade (não resisto a aconselhar o nosso Madrigal…). Mas acompanharia um bacalhau à Gomes de Sá com um branco jovem cheio de garra!

segunda-feira, 12 de março de 2012

O que nos emociona

Esta semana, o «Amável Vinho» tem a alegria de publicar uma autêntica pérola. É uma pequena entrevista, esperançadamente a primeira de uma série de entrevistas frugais. Só três perguntas, dirigidas a um conjunto de personalidades, por razões de admiração e simpatia. Pelo grato, supremo privilégio de comunicar.
O primeiro entrevistado foi tão generoso como dizem, e tão cativante como costuma. Um almoço com ele deve ser matéria de legenda, um banho de civilização. (Vejo agora que posso apresentar de modo mais simples o conjunto de entrevistados: são pessoas com quem gostava de partilhar uma refeição.) As palavras que bondosamente nos ofereceu são de apetite.
Por ora, leitores, degustemos a frase que abre as respostas de José Bento dos Santos: — «Tal como em quase tudo na vida, o sublime é o que nos emociona.»

quinta-feira, 8 de março de 2012

Um brinde a um recém-contemporâneo

A Benjamin Zenner Branco, nosso contemporâneo desde há exactamente um mês.
Dedico-te esta tradução, que fiz há tempos para mim mesmo (sê benévolo). Não te será agora tão útil como um «Babygro», mas é um poema que convém teres por perto.
Que tenhas uma vida boa!

§

Oh Eu! Oh Vida!

Oh eu! Oh vida!... das questões de estas recorrendo;
Dos infindáveis comboios dos descrentes — de cidades atestadas com os tolos;
De eu próprio continuamente recriminando a mim próprio, (pois quem mais tolo que eu, e quem mais descrente?)
De olhos que debalde anseiam a luz — dos objectos vis — da luta sempre renovada;
Dos pobres resultados de tudo — das multidões arrastadas e sórdidas que vejo ao meu redor;
Dos vazios e inúteis anos dos restantes — com os restantes eu irmanado;
A questão, Oh eu! tão triste, recorrendo — Que bem no meio destes, Oh eu, Oh vida?

Resposta.

Que tu estás aqui — que a vida existe, e a identidade;
Que o poderoso drama continua, e tu contribuirás um verso.

Walt Whitman

terça-feira, 6 de março de 2012

Quem dera um bem-haja

Aprendi hoje que «bem-haja», para além de ser uma forma de agradecimento, também designa um cacho de uvas que se encontre na vinha depois da vindima.
Imagine. Uma videira agradecida pelos cuidados, estendendo-lhe as uvas madurinhas: — Toma. Guardei para ti este cachinho.
Que maravilha.

Um brinde aos corteses

A todos os que não deixam de responder a uma mensagem recebida. A todos os que dão bons-dias a desconhecidos. A todos os que sorriem.
A quantos sabem o valor de uma palavra; que a cortesia é um sinal de inteligência; que todos somos fundamentalmente irmanados, por tempo, espaço e condição.
Bem hajam. À sua.

Brindemos

Para exprimir um desejo — façamos um brinde. Para dar graças — outro. À saúde, à memória — à nossa, à vossa — brindemos.
Bebemos todos os dias: pois façamos um brinde a cada um, a hoje e a amanhã.
Brindemos.

sexta-feira, 2 de março de 2012

Tem de ser amor

Se eu soubesse alinhavar um texto — manso como a planície — recto como a vinha — sólido como o edifício caiado.

Sorte é começar bem cedo o dia. Deus ajuda a quem madruga. Nesse dia, partimos suficientemente cedo.
Fomos directos a Arraiolos, para eu comprar uma cestinha de piquenique, para dar à mulher amada, para fazer piqueniques com ela. Continuámos até Estremoz.
Comemos açordas, migas, carne, bebemos vinho e café. Deixámos no quarto as bagagens e a garrafa meia do almoço. Seguimos para Campo Maior.
Esperava-nos Mélanie. Estava sentada na recepção da Adega Mayor, assente numa afloração da planície. Mostrou-nos um filme, projectado na pedra cinzenta e nua. Era Rui Nabeiro, vertido na obra apaixonada, acolhendo o visitante.
Mélanie conduziu-nos ao longo do edifício amplo, cru e direito.  Com grossas paredes duplas, a adega dispensa ajustes térmicos. Em cima, é isolada por um terraço relvado e um espelho de água. Um sistema computorizado regula a humidade, aspergindo a atmosfera onde repousam as barricas.
Tocada pelo entusiasmo vital dos Nabeiro, Mélanie teve frases ternas. Disse que o vinho é um produto emocional. Falou do namoro entre o vinho e a barrica. Sentámo-nos a prová-lo. Era verdade. Tem de ser fruto de amor, a graça delicada, feminil e sensual que marca aqueles vinhos, cada um. Discretamente, a barrica amadurou-o, realçou-lhe as virtudes, fundiu nele qualidades.

Cena de amor

Apontei como dilectos o Solista Touriga Nacional e os dois Reserva do Comendador, branco e tinto. Dias depois, seduzido, pedi uma garrafa do branco. Seria cerne e seiva deste texto. Veio, não a bebi. Se a beber, fico sem ela. Não sei como há-de ser.

(Continua disponível uma fabulosa publicação de 2007, com cerca de 90 páginas dedicadas por inteiro à Adega Mayor e ao projecto de Álvaro Siza Vieira. São textos, desenhos, plantas, a memória descritiva do edifício e, acima de tudo, muitas fotografias maravilhosas. Não deixe de folhear.)

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Unilar Reserva 1977

Todavia, até o mais recatado comete o seu pecadilho; e quando o vinho supera em idade o provador — que diabo, fechemos os olhos.

Unilar Reserva 1977

Caves Bonifácio. Engarrafado em 81, oriundo de Palmela, sem mais indicações (decerto é Castelão). 12,5% Vol. Cerca de 7,50 €.
Vermelho-acastanhado, com halo mais claro; não aparenta 35 anos. Desaparecido, em poucos minutos, algum cheiro de couro, as notas aromáticas mais evidentes são de fruta, ainda, licorosas e doces; também lembra osmazoma, chocolate, figo. Muito macio na boca, tem certo sabor de carne fumada, que faz pensar em enchidos; persistente e bastante aprazível.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Collares Viúva Gomes Reserva Tinto 1996

(Ei-la. Diga lá que não está de um recato heróico.)

Jacinto Lopes Baeta, Filhos. DOC Colares. Ramisco. 11% Vol. ? €.
Vermelho transparente. Um bouquet rico, complexo, em que se reconhecem notas aromáticas animais, balsâmicas, doces, de especiarias e madeiras. Incomparável na boca, na reunião de acidez, macieza e longor.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Vinho que sabe a vinho que sabe a vinho

Um velho reclame

A especial dificuldade em descrever os aromas de um Colares com dezasseis anos levou-me, de novo, a questionar a valia de uma nota de prova. Em que medida podemos confiar nos próprios sentidos? — no rigor das impressões? — na precisão da memória olfactiva?
Ressalvemos desde logo que o tema é sério (pela simples razão de que a crítica do vinho, mais ou menos influente, não deixa de ser a crítica do produtor), mas não se trata propriamente de um assunto de Estado, nem de ciência de foguetões. Usemos de alguma candura.
Em geral, gosto pouco de ler as notas de prova dos outros: são mal escritas, papagueadas, delirantes — e não despertam outro apetite senão de tisanas calmantes. Bem entendido, não quer dizer que as minhas sejam menos más. Longe disso. Todas são falíveis; simplesmente, umas são mais tragáveis do que outras.
Repare-se como, de uma penada airosa e clara, Ferreira Lapa caracterizava o Colares, em 1867: — «(…) os vinhos de Colares são intermediários aos vinhos maduros e aos vinhos verdes, possuindo daqueles a suavidade e o grato paladar, e destes a frescura, a viveza e o aroma aldeídico e tartaroso.»
Em 2009, no «Público», Miguel Esteves Cardoso, sabiamente repimpado na santa vizinhança da Adega Regional, escrevia sobre o seu Colares:
«Numa época em que tudo tem de saber a frutas tropicais, chocolate, baunilha, compotas e mijo de gato, os vinhos de Colares, sejam os tintos Ramisco ou os brancos Malvasia, estão entre os poucos que sabem… a vinho.
São raridades artesanais, blá blá blá, mas o que interessa é que são, de facto, uma delícia. Então o Colarinho branco (…) é uma frescura sequinha, extorquida à areia e ao vento e ao mar, como não há outra neste mundo.»
Nós, tão falhos em Ciência como em Arte, resta-nos o comezinho recurso dos descritores aromáticos: são as tintas prosaicas e fracas com que tentamos pintar uma ideia do vinho: uma vez por outra, é muito natural que saia borrada.

(Não perca, na próxima publicação, a nota de prova do tal Colares. Verá como eu, conturbado mas digno, resisto à tentação de apontar entre os aromas do vinho — o almíscar e o sândalo.)

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Ao Sul o sol. Um tipo de crónica

Alento

Certa manhã prometedora de sol, um tipo agarra o volante e põe-se a caminho de Estremoz. Andados poucos quilómetros, ao virar de uma curva na auto-estrada, depara-se uma muralha extensa de nevoeiro. O carro fura, adentrando outra estação, parda, nevoenta, chuvosa.
Até à ponte sobre o Tejo, é um trajecto curto mas congestionado de centos de alminhas, que rodam arrastadamente para Lisboa. Uma vez liberto, preocupado com as horas e convicto de reaver ao Sul o sol, um tipo acelera. São pontuais 10h30 quando cruza o portal e sobe à Adega do Monte Branco. Sol, está de chuva.
Um tipo é ali bem recebido, por caras jovens, gentis, que sorriem e conversam de boa vontade. Vê-se a adega, que é moderna, porém simpática, moderada em dimensões e apetrechos. Sente-se o cheiro do vinho acabado de fermentar. Conhece-se que o negócio prospera, na larga medida em que crescem as exportações. Pela janela, admira-se um momento a paisagem fria: não há uvas; não há cor; não há sol.
Vai-se dali para a Quinta do Mouro — propriedade de Miguel Louro — pai de Luís Louro — proprietário da Adega do Monte Branco. (Um tipo topa a coincidência entre «Mouro», «Louro», «M. Louro».) Tem-se aí o gosto de apertar a mão tinta do vinicultor Luís Chouriço. Ouve-se-lo explicar as modas mais conservadoras da casa, como a pisa a pés ou o uso de uma velha prensa a força de braços. Vê-se a adega, que não é moderna, porém funcional, austera em dimensões e apetrechos.
Daí, ascende-se a uma vetusta sala de visitas. Sobre a mesa, perfilam-se copos e garrafas: de um lado, os vinhos contemporâneos do Louro filho; do outro, os vinhos classicistas do Louro pai. Provam-se os primeiros, branco, rosé, tinto e reservas, que são muito bons, e um tipo tem forçosamente de elogiar o nome deles, no que tem de bem achado, e luminoso, e singelo: Luís Louro produz e engarrafa Alento.
Prossegue-se com os demais, Vinha do Mouro, Casa dos Zagalos, Quinta do Mouro, «Rótulo Dourado», e um tipo observa que, quanto mais severo o rótulo, tanto maior o condão que o vinho tem de emudecer em reverência um tipo.
Entretanto, é hora de almoço. O céu parece clarear um pouco. Trocam-se adeuses e obrigados.
Sozinho em Estremoz, famélico, pouco abonado — que há-de um tipo fazer? Suprema sofisticação da simplicidade: vai comer uma açorda fumegante, que é de poejos e recende.
Depois, sai-se para a rua. Está sol, finalmente. Parecendo que não, é outro alento.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Os rapazes

Os rapazes

Encantei-me por esta fotografia. Descobrimo-la recentemente, vasculhando com a minha Avó as suas recordações.
Não sabemos de que grupo se trata, nem qual era a ocasião. Fosse qual fosse, tinha suficiente importância para se vestir casaco e tirar retrato. A brilhantina, suponho que era de uso quotidiano. Naquela época (finais de cinquenta, começos de sessenta), os rapazes, se algum tempo passavam ao espelho, não era a despentear-se.
Quanto se pode perceber, a esta mesa todos bebem vinho, mesmo os petizes. Há um rapazito de buço, meio escondido, que tem o copo vazio: ou foi o primeiro a emborcá-lo, ou, o que é mais certo, é o copinho-de-leite da ordem. Já o fedelho defronte tem um copo cheio, e tão danadinho estaria, que até saiu desfocado. A senhora risonha do fundo também não tem vinho; mas repare o leitor no brilho daquele rosto; no regalo daquela perna traçada.
(Antes de voltarmos aos rapazes, não lhe parece um tanto lúbrico aquele olhar fêmeo, por detrás do crianço de colarinhos? Não? É talvez da minha vista.)
Então, os rapazes: em ziguezague, depois do copinho-de-leite e o outro fedelho, temos um flagrante delitro de arregalar o olho; um rapazola todo contente; um sujeito que prefere não ver; outro prestes a decilitrar — ou a escavacar o fotógrafo; o seguinte, de que se vê somente a testa, talvez já comesse qualquer coisinha mais do que pão e azeitonas.
Quanto ao cavalheiro mais garboso de entre todos, chamava-se José Reinaldo Ferreira Inácio. Viveu entre 1932 e 2006. Foi meu Avô, e um bom rapaz.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Almojanda 2003

Mais uma excentricidade emanada do que se chama «as leis de mercado»: o Intermarché de Mafra está a vender o Almojanda 2003, da Tapada do Chaves, a 1,89 €. A promoção (salvo seja) estará relacionada com a descontinuação da marca, mas também, por certo, com a idade do vinho.
Já agora, registe-se que certo branco de Sandra Tavares da Silva, passível de inspirar exclamações, continua a poder comprar-se por 1,99 €, no Ecomarché da Merceana. Grande negócio...
Enfim, é o desconcerto do mundo. Está certíssimo.

Almojanda 2003
Tapada do Chaves. Regional Alentejano. Trincadeira, Castelão, Aragonez. 13,5% Vol. 1,89 €.
Vermelho-escuro, com um halo de evolução. Aroma doce e perfumado, de fruta perfeitamente casada com madeira, temperado por notas vegetais, como de eucalipto ou resina. Assim também na boca, bem vivo, bem fresco, bem bom.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Vinhas do Lasso Colheita Seleccionada 2009

Quinta do Pinto. Regional Lisboa. Touriga Nacional, Syrah, Cabernet Sauvignon. 14% Vol. 8 € (em restaurante).
Vermelho-escuro opaco. Aroma licoroso de fruta, balsâmico, de pimento, cremoso, de baunilha, com pós de canela. Na boca, repete-se a impressão de pimento sobre fruta, junta com apreciável frescura e uma ponta de adstringência. Fez bela figura com um cozido.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Uma questão de tempo

Ao fundo, a adega

O tempo foge. Como é possível que passasse outro Natal, e outro Ano Novo, e outro Janeiro? Ainda há tão pouco éramos novos. Não sabíamos o que eram cãs, nem dívidas, nem mortos. O Mundo girava mansamente, com o fim único de presenciar a nossa glória. Nós não falharíamos: havia tempo para tudo — e tudo é uma questão de tempo.
Entretanto, correm os dias. O leitor sabe como são velozes os dias que correm, indiferentes a angústias e fadigas. Infindos afazeres, obrigações, cuidados, e Internet a perder de vista, e navegar é preciso. Quando se dá conta, não há tempo para nada.
Admiravelmente alheia a este aspecto de corrida contra o tempo, que a vida sempre parece adquirir, a adega do Mouchão, toda serenidade, método, harmonia, afigura-se-me a mais amável de quantas tenho conhecido.

Adega do Mouchão

Na propriedade dos Reynolds, família de origem escocesa, a celebrada fleuma britânica é sinónimo de grande paciência, de falta de pressa — de vagar. Quanto a indiferença, se alguma, só, precisamente, pelo ar do tempo. «Não tencionamos mudar.» Eis a voz corrente, e uma afirmação que não deslustraria como insígnia; mas a casa é bem servida, também nesse particular: — «VINUM SANGUIS VITAE». O vinho é o sangue da vida.
Para esquentar o meu, quem dera agora o calor que fazia quando atravessei a Vinha dos Carapetos, berço provável da Alicante Bouschet em Portugal. A casta é a base de todos os tintos do Mouchão. São vinhos de um carácter extraordinário, retintos, ricos, longevos, como é exemplo o notável 1990 que me foi dado provar.

O sangue da vida

Nesse ano, leitor, ainda a bendita adega não tinha electricidade. Chegou em 91, mas tudo permanece capaz de laborar sem ela. É que o vinho é ali feito hoje como há cem anos; e é regra no Mouchão não haver mais novidades do que duas por século. Afinal de contas, é preciso dar tempo ao tempo.
Ainda vai ser um longo Inverno. Então não vai...

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Esplanada 2008

DFJ Vinhos. Regional Algarve. Negra Mole, Trincadeira. 14,5% Vol. Cerca de 4 €.
Vermelho. Aromas doces de fruta madura, com um perfume vegetal subtil. Agradável de beber, harmonioso, simples, liso, qual esfera.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Monte Mayor 2010

Adega Mayor. Regional Alentejano. Aragonez, Trincadeira, Alicante Bouschet, Syrah, Petit Verdot. 14% Vol. Oferta do produtor.
Vermelho-escuro. Aroma intensamente frutado, de morangos e amoras, com um fundo de baunilha, que suscita a mesma impressão cremosa dos caramelos de fruta. Corresponde na boca, bem saboroso e estruturado, de final fresco e cativante.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Batem forte, fortemente

A ler com atenção, a crónica de Jancis Robinson sobre as razões da escalada do grau alcoólico do vinho nos últimos anos.
«Os economistas do vinho foram capazes de mostrar que o aumento dos níveis médios de álcool era muito maior do que podia ser explicado por qualquer mudança no clima, e concluíram: “as nossas descobertas levam-nos a pensar que a subida do teor alcoólico do vinho é principalmente obra humana”. Apontaram em particular “preferências dos consumidores em evolução e pontuações de peritos” como mais provável a ter feito subir os níveis de álcool. Por outras palavras, os produtores de vinho entendem que tanto consumidores como especialistas querem vinhos com um sabor mais maduro, taninos mais suaves e acidez mais baixa (os níveis de ácidos caem à medida que as uvas amadurecem), e optaram deliberadamente por fazer colher as uvas mais tarde do que em tempos foram.»

sábado, 21 de janeiro de 2012

Casal Freitas 2008

Por falar em Castelão e Fernando Pó, eis a nota de prova de um vinho aludido há tempos.
A propósito, quando vi comparar Castelão a Pinot Noir, o que primeiro me lembrou foram justamente as notas aromáticas animais, que julgo serem características de ambas as castas, quando criadas nos melhores terroirs.

Casal Freitas 2008
José Bento da Silva Freitas. Regional Terras do Sado. Castelão, Touriga Nacional, Syrah. 13,5% Vol. Cerca de 2,50 €.
Vermelho-escuro intenso. Aroma frutado, de feição gorda, com certa nota animal, que parece lembrar ovelhas… Corpo fluido, sabor equilibrado, com um toque vegetal.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Uma palavrinha

Que máquina extravagante é o cérebro humano. Hoje, sem mais nem porquê, meteu-se-me na ideia que falhara uma palavra na primeira citação do artigo anterior, sobre os vinhos de Castelão de Palmela. Fui ver, e de facto faltava essa palavra (já não falta, assim como o par de aspas que havia também subtraído ao original).
Para me redimir, copio aqui o mesmo trecho, alargando-o, por ser de interesse. Ora veja o leitor que diferença faz uma palavra.
«A Península de Setúbal é, talvez, a zona do País onde ela [a Castelão] melhor se adapta, embora se lhe reconheçam comportamentos muito distintos. Assim, nas areias do Poceirão e Fernando Pó, em bons anos de colheita, pode atingir 6 a 8 toneladas de uva por hectare, com um grau provável de 13-13,5%, rica de cor, muito aromática e equilibrada na acidez. Origina, então, belos vinhos de guarda, carnudos, com notas aromáticas de frutos vermelhos e plantas silvestres, que “casam” muito bem com o perfume do carvalho francês.»

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Conhecer. Comunicar.

Há umas poucas semanas, trouxe finalmente para casa certa garrafa que me trazia curioso: Hero da Machoca Grande Escolha 2001. Não sabia do vinho senão, como estava à vista, que era Castelão de Palmela estreme, vinificado em lagares tradicionais, premiado em Bruxelas com medalha de prata, em 2004.
Desarrolhei a dita garrafa no outro fim-de-semana, por ocasião de um almoço em família. Não pude na circunstância tomar grande sentido no copo, mas o vinho era uma flagrante delícia, caso sério a requerer atenção. No dia seguinte, voltei ao supermercado e deitei mão às três garrafas que restavam na prateleira, as mesmíssimas que havia semanas lá deixara.
Este domingo, cá se bebeu outra, de par com uma travessa de almôndegas, récipe de influência transmontano-neerlandesa. O vinho confirmou-se esplêndido (a nota de prova terá de esperar pela garrafa seguinte), com todas as qualidades que se reconhecem aos melhores exemplares da Castelão de Palmela, como são apontadas no guia de referência em matérias de ciência vitivinícola nacional: — «belos vinhos de guarda, carnudos, com notas aromáticas de frutos vermelhos e plantas silvestres, que “casam” muito bem com o perfume do carvalho francês.» Sobre o produtor deste Hero da Machoca, diz-se aí também que as suas vinhas são maioritariamente velhas e «estão situadas no Poceirão e na Marateca, consideradas zonas excepcionais para a produção de uvas da casta Castelão.» Depois há «a mão do enólogo António Saramago — um verdadeiro mestre da casta e da região».
Note-se ainda que Filipa Tomaz da Costa, a primeira das enólogas portuguesas, compara mesmo a Castelão da Península de Setúbal à Pinot Noir da Borgonha.
Quero eu afinal chegar ao preço que paguei por este vinho rico e longevo, feito de uma casta autóctone de Portugal, no seu terroir mais propício, por um dos nossos mais conceituados vinicultores — portanto, um produto de qualidade superior, que serviria bem o fim de ilustrar e promover nos mercados de exportação o carácter genuíno dos vinhos portugueses. Embora ele se venda na origem a 9,45 €, eu comprei num Intermarché o Hero da Machoca Grande Escolha 2001 por 3,99 €.
Casos destes são, no imediato, formidáveis para o consumidor escasso de finanças; mas para o produtor, para a Economia, para o futuro do país, não se conhecer de entre o bom o singular, não o comunicar, e malbaratar a riqueza que se tem — é aviltante.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Notas Amadoras: Quinta do Poço do Lobo Reserva 2007

Caves São João. DOC Bairrada. Baga, Touriga Nacional, Cabernet Sauvignon. 13,5% Vol. 7,23 €.
Vermelho-escuro intenso. Aroma de fruta e plantas silvestres, com um toque de chocolate. Sabor maduro, macio e equilibrado.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Notas Amadoras: Quinta do Casal Branco 2010

Regional Tejo. Fernão Pires. 13% Vol. Cerca de 3 €.
Amarelo-claro. O aroma intenso, frutado e floral, lembra marmelo, mas também fumo e azeitonas. Esperto na boca, com acidez citrina e uma ligeira sensação de espessura.