segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

Dedais & quarteirões

Outro dia almocei fora — por sinal, no meu restaurante favorito. Havemos de lá ir um dia destes, leitores.

Entre a refeição — bons pão e azeitonas, uma saborosa carne de porco à alentejana, um honesto pudim — e uma prova de três tintos que fiz depois, como quem arrebenta diabos, contabilizei 2.7 unidades de álcool. Aliás, para o efeito, estimar é um verbo bem mais apropriado.

Estimei, então, uns 150 mililitros bebidos pausadamente ao almoço, mais 50 nas provas. Para facilitar as contas, considerei o mesmo teor alcoólico de 13,5% para os quatro vinhos, multiplicando-o pelos 0,2 litros ingeridos, assim obtendo o número de 2.7 unidades.

Se, por curiosidade, quisesse saber a quantidade de álcool puro que me administrei, bastaria esta operação: 0,2 l x (0,135 vol. x 789,24 g/l) = 21,3 g (o multiplicando entre parênteses representa a densidade do álcool a 20° C).

Há algum tempo que sigo as recomendações das autoridades sanitárias do Reino Unido, que acho sensatas e consentâneas com a minha natureza: não exceder as 14 unidades de álcool por semana; distribuí-las razoavelmente por quatro ou cinco dias; e dar descanso ao fígado em outros dois ou três.

Além de benéfico e facílimo, o consumo alcoólico neste regime regrado, moderado, virtuoso, concede prazeres particulares, insuspeitados. A mim, por exemplo, proporciona-me a grande satisfação linguística de beber em dedais e quarteirões: não tomo senão um dedal — «porção mínima de alguma coisa», segundo o dicionário Houaiss — de Porto, Moscatel ou Carcavelos, e a minha justa medida de vinho de mesa é «a quarta parte de um quartilho», ou seja, 125 mililitros — isto é, um quarteirão.

Como não sou maluco de todo nem dado a obsessões nem extremismos, já tenho prevaricado e bebido, deliberadamente, vinho aos marqueses — meios quartilhos —, aos quartilhos — meios litros — e, em maiores talagadas, à garrafa — a unidade alcoólica das férias, digamos.

No dia-a-dia, porém, relembro a lição de sobriedade de Cornaro: «uma vida regular é um excelente preservador contra todos os males naturais, e (...) a intemperança produz efeitos completamente contrários».

Modéstia, modéstia. É o que eu sempre digo.

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