terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Conhecer. Comunicar.

Há umas poucas semanas, trouxe finalmente para casa certa garrafa que me trazia curioso: Hero da Machoca Grande Escolha 2001. Não sabia do vinho senão, como estava à vista, que era Castelão de Palmela estreme, vinificado em lagares tradicionais, premiado em Bruxelas com medalha de prata, em 2004.
Desarrolhei a dita garrafa no outro fim-de-semana, por ocasião de um almoço em família. Não pude na circunstância tomar grande sentido no copo, mas o vinho era uma flagrante delícia, caso sério a requerer atenção. No dia seguinte, voltei ao supermercado e deitei mão às três garrafas que restavam na prateleira, as mesmíssimas que havia semanas lá deixara.
Este domingo, cá se bebeu outra, de par com uma travessa de almôndegas, récipe de influência transmontano-neerlandesa. O vinho confirmou-se esplêndido (a nota de prova terá de esperar pela garrafa seguinte), com todas as qualidades que se reconhecem aos melhores exemplares da Castelão de Palmela, como são apontadas no guia de referência em matérias de ciência vitivinícola nacional: — «belos vinhos de guarda, carnudos, com notas aromáticas de frutos vermelhos e plantas silvestres, que “casam” muito bem com o perfume do carvalho francês.» Sobre o produtor deste Hero da Machoca, diz-se aí também que as suas vinhas são maioritariamente velhas e «estão situadas no Poceirão e na Marateca, consideradas zonas excepcionais para a produção de uvas da casta Castelão.» Depois há «a mão do enólogo António Saramago — um verdadeiro mestre da casta e da região».
Note-se ainda que Filipa Tomaz da Costa, a primeira das enólogas portuguesas, compara mesmo a Castelão da Península de Setúbal à Pinot Noir da Borgonha.
Quero eu afinal chegar ao preço que paguei por este vinho rico e longevo, feito de uma casta autóctone de Portugal, no seu terroir mais propício, por um dos nossos mais conceituados vinicultores — portanto, um produto de qualidade superior, que serviria bem o fim de ilustrar e promover nos mercados de exportação o carácter genuíno dos vinhos portugueses. Embora ele se venda na origem a 9,45 €, eu comprei num Intermarché o Hero da Machoca Grande Escolha 2001 por 3,99 €.
Casos destes são, no imediato, formidáveis para o consumidor escasso de finanças; mas para o produtor, para a Economia, para o futuro do país, não se conhecer de entre o bom o singular, não o comunicar, e malbaratar a riqueza que se tem — é aviltante.

4 comentários:

Hugo Mendes disse...

belo post. parabens!

João Inácio de Paiva disse...

Obrigado, e obrigado por ler.

Paulo Mendes disse...

Óptimos vinhos eram estes Hero da Machoca, Hero dos Avós e a grande relação qualidade preço dos Hero do Castanheiro. Eram presença obrigatória em casa e em muitas refeições. Eram vinhos de enorme prazer, carnudos mas elegantes, aveludados e saborosíssemos. Há muito que não os vejo à venda. Não sei se ainda são produzidos e/ou engarrafados. Obrigado pela sua lembrança. Despertou-me a curiosidade de procurar o produtor... http://ovinhoemfolha.blogspot.com/

João Inácio de Paiva disse...

Viva, Paulo.
Nunca tive ocasião de provar os vinhos parentes deste, mas só podem mesmo ser bons.
Obrigado pelo seu comentário.