«Afasta o frio, repondo sem parcimónia na lareira
a lenha, e ainda mais generosamente retira,
ó Taliarco, da sabina ânfora
o vinho de quatro anos:
confia o resto aos deuses, pois mal eles acalmem
os ventos que no impetuoso mar pelejam
nem os ciprestes se agitarão
nem os velhos freixos.»
Horácio, em «Odes», p. 65 (Cotovia, 2008)
quarta-feira, 22 de dezembro de 2010
segunda-feira, 20 de dezembro de 2010
Sonho de uma noite de Outono
segunda-feira, 13 de dezembro de 2010
Uma qualidade deliciosa
O Professor José Hermano Saraiva é um venerando cavalheiro de 91 anos, que se vê e se ouve sempre com grande prazer. Os seus programas televisivos de divulgação cultural contam já 40 anos.
No último Verão, o Professor dedicou um episódio do seu «A Alma e a Gente» a Anadia, coração da Bairrada e berço dos vinhos espumantes portugueses. É pouco antes dos 6 minutos de programa que ele se serve um copo do espumante bruto da Estação Vitivinícola da Bairrada — «de uma qualidade deliciosa. Deliciosa.»
Saboreando o vinho, remata: — «Não distinguiria este espumante dos champanhes franceses; mas eu não sou um entendido.»
A não perder, este episódio de «A Alma e a Gente».
No último Verão, o Professor dedicou um episódio do seu «A Alma e a Gente» a Anadia, coração da Bairrada e berço dos vinhos espumantes portugueses. É pouco antes dos 6 minutos de programa que ele se serve um copo do espumante bruto da Estação Vitivinícola da Bairrada — «de uma qualidade deliciosa. Deliciosa.»
Saboreando o vinho, remata: — «Não distinguiria este espumante dos champanhes franceses; mas eu não sou um entendido.»
A não perder, este episódio de «A Alma e a Gente».
quinta-feira, 25 de novembro de 2010
Dois companheiros dourados
Bebi ontem dois bons vinhos de 2003: Terra Cota, um branco ribatejano, e o Colheita Tardia da Niepoort.
Foi uma feliz coincidência, reunirem-se no frigorífico dois companheiros de colheita. Imagino que um tal encontro não pudesse ocorrer em muitos outros lares, pela simples razão de que o Mercado, esse brutamontes, não gosta de brancos com mais de dois ou três anos de idade. O Mercado não tem vagar para subtilezas.
Os sete anos destes dois vinhos puseram em ambos sensivelmente o mesmo suave dourado. O Terra Cota, feito de Fernão Pires, está melífluo de aroma, mas não perdeu a frescura. Tem mesmo um agradável fundo vegetal, viçoso, que o torna muito bom de beber. A 3 € a garrafa, foi um achado.
O Colheita Tardia da Niepoort, comprei-o depois de ouvir na rádio a entrevista que o Francisco José Viegas fez a Alfredo Saramago, a propósito do lançamento de um livro em que o gastrónomo apresenta uma selecção de 125 vinhos. Esse programa, de 2007, ainda pode, e merece, ser ouvido. Sobre a degustação de um vinho e a linguagem dos críticos, diz Alfredo Saramago: — «Por exemplo: um determinado aroma a chocolate; um determinado aroma a frutos maduros. Sim, porque aquilo é feito de fruta, não é verdade? Mais madura ou menos madura. Há uma quantidade de termos que são perfeitamente compreensíveis, e que nós, de uma maneira ou de outra, chegamos lá. Há outros que são delírio.»
Mais adiante, o Francisco José Viegas confessa-se «destruído» por não ter encontrado uma garrafa deste Colheita Tardia, que, no livro do seu entrevistado, aparece assim descrito: «Cor magnífica. Bem estruturado. Aromas ricos. Mais um ano e será paixão.»
Quanto a mim, trata-se realmente de um belo vinho, com um aroma que lembra maracujá e uma doçura bem temperada de acidez. Não o achei apaixonante, mas agradou-me; e, como também dizia Alfredo Saramago, «esse agradar-me já é muito bom».
Foi uma feliz coincidência, reunirem-se no frigorífico dois companheiros de colheita. Imagino que um tal encontro não pudesse ocorrer em muitos outros lares, pela simples razão de que o Mercado, esse brutamontes, não gosta de brancos com mais de dois ou três anos de idade. O Mercado não tem vagar para subtilezas.
Os sete anos destes dois vinhos puseram em ambos sensivelmente o mesmo suave dourado. O Terra Cota, feito de Fernão Pires, está melífluo de aroma, mas não perdeu a frescura. Tem mesmo um agradável fundo vegetal, viçoso, que o torna muito bom de beber. A 3 € a garrafa, foi um achado.
O Colheita Tardia da Niepoort, comprei-o depois de ouvir na rádio a entrevista que o Francisco José Viegas fez a Alfredo Saramago, a propósito do lançamento de um livro em que o gastrónomo apresenta uma selecção de 125 vinhos. Esse programa, de 2007, ainda pode, e merece, ser ouvido. Sobre a degustação de um vinho e a linguagem dos críticos, diz Alfredo Saramago: — «Por exemplo: um determinado aroma a chocolate; um determinado aroma a frutos maduros. Sim, porque aquilo é feito de fruta, não é verdade? Mais madura ou menos madura. Há uma quantidade de termos que são perfeitamente compreensíveis, e que nós, de uma maneira ou de outra, chegamos lá. Há outros que são delírio.»
Mais adiante, o Francisco José Viegas confessa-se «destruído» por não ter encontrado uma garrafa deste Colheita Tardia, que, no livro do seu entrevistado, aparece assim descrito: «Cor magnífica. Bem estruturado. Aromas ricos. Mais um ano e será paixão.»
Quanto a mim, trata-se realmente de um belo vinho, com um aroma que lembra maracujá e uma doçura bem temperada de acidez. Não o achei apaixonante, mas agradou-me; e, como também dizia Alfredo Saramago, «esse agradar-me já é muito bom».
domingo, 21 de novembro de 2010
Favorável vinho
«Depois do jantar, com a cabeça quente mas direitinho nas minhas pernas como a torre gótica da igreja românica de Meursault, sentia-me numa forma olímpica. Não vi nenhum conviva sair do château a cambalear. Os vinhos medíocres tornam o joelho mole e a língua pastosa; os vinhos muito bons favorecem as articulações dos ossos e das palavras.»
Bernard Pivot, em «Dicionário Sentimental do Vinho», p. 183 (Casa das Letras, 2007)
Bernard Pivot, em «Dicionário Sentimental do Vinho», p. 183 (Casa das Letras, 2007)
sexta-feira, 19 de novembro de 2010
Civilização
De acordo com a Antena 1, o Presidente Cavaco Silva e o Presidente Barack Obama, que hoje almoçaram juntos no Palácio de Belém, beberam Cerro das Mouras Grande Escolha 2009, um branco do Douro.
Também se sabe que o presidente português ofereceu ao norte-americano um decantador e os cálices oficiais do Vinho do Porto, ambos da autoria de Siza Vieira, juntamente com uma garrafa de Quinta do Noval Vintage 2008, o ano em que Obama foi eleito.
Sobre o generoso, a jornalista da Antena 1 esclareceu: — «É considerado um vinho quase perfeito, muito elegante, um vinho guloso, e é um excelente cartaz para os nossos vinhos do Porto.»
Não é todos os dias que há tanta civilização nas notícias.
Também se sabe que o presidente português ofereceu ao norte-americano um decantador e os cálices oficiais do Vinho do Porto, ambos da autoria de Siza Vieira, juntamente com uma garrafa de Quinta do Noval Vintage 2008, o ano em que Obama foi eleito.
Sobre o generoso, a jornalista da Antena 1 esclareceu: — «É considerado um vinho quase perfeito, muito elegante, um vinho guloso, e é um excelente cartaz para os nossos vinhos do Porto.»
Não é todos os dias que há tanta civilização nas notícias.
quinta-feira, 18 de novembro de 2010
V. Q. P. R. D.
Os primeiros copos de vinho, bebi-os por volta dos 18 anos, numa tasca que ficava a dois passos da escola. Era o estabelecimento da severa D. Custódia, onde os estudantes, antes, depois ou em vez das aulas, regularmente jogavam matraquilhos e matavam a sede.
De entre esses fregueses, nós, que formávamos a equipa de voleibol da escola, éramos talvez os mais assíduos. No fim do treino físico, rumávamos à Custódia, para o treino de especialidade. Aliás, passado pouco tempo, «os treinos» designavam menos o tempo de correr ou de ensaiar jogadas do que o tempo de beber. «Ir aos treinos» significava ir beber copos à Custódia.
A verdade é que, se nos fizemos uma equipa aguerrida, unida, difícil de bater, o devemos ao vinho. O bebermos vinho já nos distinguia dos demais rapazes; bebê-lo juntos, numa congregação ritual, irmanáva-nos. E depois, o vinho, na sua bondade, conferia-nos força e emprestava-nos o seu melhor espírito. Nós jogávamos com a mesma galhardia com que esvaziávamos os jarros da velha Custódia.
Para além disso, éramos uns vaidosos. Nos torneios da escola, que ganhávamos impiedosamente, a nossa equipa dava pelo nome de «V. Q. P. R. D.». No início de cada jogo, como uma bruta invocação às musas, rugíamos o nosso grito de alento: — «TINTO!»
De entre esses fregueses, nós, que formávamos a equipa de voleibol da escola, éramos talvez os mais assíduos. No fim do treino físico, rumávamos à Custódia, para o treino de especialidade. Aliás, passado pouco tempo, «os treinos» designavam menos o tempo de correr ou de ensaiar jogadas do que o tempo de beber. «Ir aos treinos» significava ir beber copos à Custódia.
A verdade é que, se nos fizemos uma equipa aguerrida, unida, difícil de bater, o devemos ao vinho. O bebermos vinho já nos distinguia dos demais rapazes; bebê-lo juntos, numa congregação ritual, irmanáva-nos. E depois, o vinho, na sua bondade, conferia-nos força e emprestava-nos o seu melhor espírito. Nós jogávamos com a mesma galhardia com que esvaziávamos os jarros da velha Custódia.
Para além disso, éramos uns vaidosos. Nos torneios da escola, que ganhávamos impiedosamente, a nossa equipa dava pelo nome de «V. Q. P. R. D.». No início de cada jogo, como uma bruta invocação às musas, rugíamos o nosso grito de alento: — «TINTO!»
quinta-feira, 11 de novembro de 2010
Vinho fresco, esperto, seivoso
«Mas nada o entusiasmava como o vinho de Tormes, caindo de alto, da bojuda infusa verde — um vinho fresco, esperto, seivoso, e tendo mais alma, entrando mais na alma, que muito poema ou livro santo. Mirando, à vela de sebo, o copo grosso que ele orlava de leve espuma rósea, o meu Príncipe, com um resplendor de optimismo na face, citou Virgílio:
— Quo te carmina dicam, Rethica? Quem dignamente te cantará, vinho amável
destas serras?»
Eça de Queiroz, em «A Cidade e as Serras»
— Quo te carmina dicam, Rethica? Quem dignamente te cantará, vinho amável
destas serras?»
Eça de Queiroz, em «A Cidade e as Serras»