Há uma semana, Andrew Jefford — autor do sensato e útil
101 Coisas que Deve Saber sobre Vinhos (Cotovia, 2001) — dedicou a sua coluna das segundas-feiras
na revista Decanter ao tema das notas de prova. Em sua opinião, as de Robert Parker «permanecem o padrão de ouro. São extensas o suficiente para fazer justiça aos vinhos sobre que está escrever e, embora não polidas em nenhum sentido literário, transmitem o carácter do vinho com grande destreza, são intrinsecamente coerentes, muitas vezes enquadram o vinho nas colheitas anteriores ou em outros contextos vinários, sendo também subtilmente preditivas sobre a sua trajectória evolutiva, e fervilham com o tipo de energia e entusiasmo que pode animar o leitor a fazer uma compra.»
Recordo muitas vezes uma passagem de
A Relíquia, do Eça: «esse “descarado heroísmo de afirmar”, que, batendo na Terra com pé forte, ou palidamente elevando os olhos ao Céu — cria, através da universal ilusão, ciências e religiões.»
Com efeito, no campo da nossa escrítica de vinhos, o heróico descaramento — o topete — é tamanho e tão frequente, que não apenas se faz uso comum da
afirmação, mas também se generalizou a utilização de um número de palavras exóticas, que por sinal não existem, como “compotado”, “especiado”, “limonado” etc. Nas fileiras de autores, bloguistas, críticos, jornalistas e demais peritos, há verdadeiros super-heróis da afirmação, façanhudos temíveis a adjectivar, e a exclamar, e a pontuar.
Quanto a mim, por minha fé, não passo de um amador. Bebo vinhos baratos. Publico notas de prova deliberadamente simples. Desconfio dos entendidos, de haver tantos entendidos, das associações de entendidos. Prefiro amiúde o inactual — a tradição. Tenho pena que seja moda dizer “private selection” em vez de garrafeira, “wine bar” em vez de bar de vinho(s), ou bar vínico, “wine lover” em vez de amante, ou amador, ou apreciador de vinho(s), … Provavelmente, estou em minoria.
Pelo que vai exposto, caro leitor, tive uma ideia tola e feliz: um grupo de AA: Apreciadores Amadores. Um grupo almoçante de amparo e camaradagem entre humildes apreciadores amadores, que porém fazem algum caso das palavras. Chamemos-lhe — os Vencidos do Vinho. Estão abertas as inscrições.