segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Modus operandi

Como se faz

Visita à Quinta do Monte d’Oiro
Um lugar de civilização. Lugar também de vento forte e constante, daí o nome da freguesia: Ventosa. A poucos quilómetros, é a Abrigada. 20 ha de vinhas em produção. 60% é Syrah. Todo o vinho do Monte d'Oiro tem um conceito gastronómico. De cada um que se provava, a Graça dizia com que comida casaria. Contou que Bento dos Santos é generoso, cultiva o prazer da partilha. Assim, na companhia dele, tem provado os melhores vinhos do mundo. Segundo ela, Bento dos Santos diz que o vinho é para beber, não para provar. Diz também que os vinhos do Monte d'Oiro são naturalmente gastronómicos. Ao fundo da adega, velando as pipas, estão duas estátuas (de madeira, creio): uma figura de mulher, representando a Arte, e uma de homem, representando o Engenho. Desde que ali chegou, em 2005, a Graça foi aligeirando e apurando o Madrigal, que achava pesado. Fê-lo aos poucos, porque foi preciso ir convencendo Bento dos Santos das suas razões. É ele quem idealiza os vinhos. Graça é a técnica que os executa, também tendo sua palavra. Em geral, não gosta dos brancos de Viognier dos outros. Diz que se trata de uma casta difícil de criar e de trabalhar. Como a Fernão Pires, facilmente origina vinhos perfumados em excesso, fáceis, oferecidos. Quanto a ela, prefere discrição e elegância. É a marca da Quinta do Monte d'Oiro.

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Notas Amadoras: Touriz 2006

Casa Santos Lima. Regional Estremadura. Touriga Nacional, Touriga Franca, Tinta Roriz. 13% Vol. 9 € (em restaurante).
Vermelho-escuro. Aroma vivo de fruta vermelha, como ginjas e morangos, de compotas e de bolos, temperado por uma nota vegetal. Na boca, aveludado e fresco.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Notas Amadoras: Quinta da Fonte do Ouro 2006

Soc. Agr. Boas Quintas. DOC Dão. Trincadeira, Jaen, Rufete. 12,5% Vol. Cerca de 4,50 €.
Cor púrpura. Rico em aromas, lembra, aos poucos, caramelos de fruta, ameixa, especiarias, pêra, o perfume da bergamota. Na boca, leveza, frescura, uma textura polida, com acidez e taninos sensíveis.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Notas Amadoras: Dom Martinho 1998

Soc. Agr. Quinta do Carmo. Regional Alentejano. Sem informação de castas. 13% Vol. 10 € (em restaurante).
Vermelho-escuro transparente. Tinha o grato perfume do vinho velho, mas já declinando. À mesa, ainda se mostrou capaz, refrescando e agradando bem a boca.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Atrás dos fantasmas

Não há muito tempo, por razões que não vêm ao caso, fui à procura de um homem que não conhecia, a quem pretendia falar. «Fui à procura» é como quem diz, porque eu nem sequer me levantei. Pouco mais sabia dele do que o nome. Fiz pesquisas, inferências, conjecturas. No fim, enviei um e-mail. Poucos minutos depois, na volta do correio, chegava uma mensagem lapidar: — «Ex.mo Senhor: O Dr. A. C. faleceu em Janeiro de 2003.»
Quando, no começo do Verão, fui à procura (por assim dizer) de certo branco esquisito, muito famoso e apetecido no seu tempo, não quiseram dar-me a notícia de chofre. Foi preciso levantar-me e rumar à Casa das Gaeiras para perceber que andava atrás de outro fantasma.

A Casa das Gaeiras
A velha propriedade de muros amarelo-ocre da vila das Gaeiras, no concelho de Óbidos, tem uma história que se perde no tempo — e na Internet, onde a informação sobre ela é escassa e pouco exacta. Por conseguinte, talvez seja de interesse a publicação de uma pequena cronologia da Casa das Gaeiras, que alinhavei cruzando a genealogia dos seus senhores, os materiais e depoimentos lá recolhidos e as fontes digitais.
1720
Construção da Casa das Gaeiras. O seu fundador, um comerciante hamburguês, consagra-a ao fabrico de curtumes.
C. 1800
António Gomes da Silva Pinheiro (1763-1834), médico e militar, adquire a propriedade.
1803-1858
Vida de José Maria Gomes da Silva Pinheiro, filho de António Gomes da Silva Pinheiro.
1850-1904
Vida de José Maria Gomes Viseu da Silva Pinheiro, filho de José Maria Gomes da Silva Pinheiro. Segundo um folheto da própria Casa das Gaeiras, a sua parte mais moderna é construída «mesmo no final do século XIX, bem como os vastos jardins (…) vinhas e instalações vinárias». Tudo indica que é este Silva Pinheiro quem impulsiona a produção vitivinícola. Muitos prémios obtidos (quiçá os primeiros) em exposições como a de Filadélfia são do seu tempo. O mesmo folheto reproduz um anúncio antigo, onde se lê: — «Bebam Gaeiras, o vinho de meza superior. Comprovado nos 25 primeiros prémios obtidos nas exposições nacionais e estrangeiras desde 1876».
1874-1957
Vida de Emília Garrido Pinheiro, filha de José Maria Gomes Viseu da Silva Pinheiro.
1908-1998 (?)
Vida de José Pinheiro Ferreira Pinto Basto, filho de Emília Garrido Pinheiro. Enólogo diplomado em Montpellier, onde terá sido colega de António Porto Soares Franco (1906-1968), da José Maria da Fonseca.
1934-2008
Vida de Frederico Eduardo Ferreira Pinto Basto Lupi, sobrinho de José Pinheiro Ferreira Pinto Basto.
Nos últimos anos, a vitivinicultura das Gaeiras foi confiada aos técnicos da Parras, empresa ligada à Quinta do Gradil, por sinal outra casa com tradição na Estremadura, que produz um conjunto de vinhos passível de agradar a todos os gostos.
Bem diferente consta que era o antigo branco das Gaeiras. Em 2002, no «Guia Repsol», o Prof. Virgílio Loureiro apresentava-o como uma referência, «parte da história do vinho em Portugal»:
«[O Gaeiras branco] ainda hoje é feito à moda antiga, fermentando em tonéis e estagiando sobre a “mãe” durante vários meses. Com uma cor amarelo palha e notas fumadas, é um vinho para conhecedores, com aromas resinosos e de querosene, bom corpo e excelente acidez, que tem, por vezes, um envelhecimento nobre em garrafa.»
A tipicidade do Gaeiras provinha das uvas de Vital, da influência marítima e, com certeza, da «moda antiga». Hoje, a Vital deu lugar a outras castas. A moda antiga perdeu para as modas novas. Afinal, o moderno Casa das Gaeiras está como nós: resta-lhe a proximidade do mar e os fantasmas do que se vai perdendo. É a vida.